Skip to main content
ComissõesNotasNotícias

Nota Técnica: Contribuições da Comissão de Direito Eleitoral da OAB SP para a Reforma Política

By 7 de julho de 2021julho 9th, 2021No Comments
Direito Eleitoral Reforma Política
  1. Introdução:

A Comissão Especial de Direito Eleitoral da OAB SP apresenta a presente Nota Técnica com o objetivo de contribuir com os debates acerca da reforma eleitoral que estão sendo realizados atualmente no Congresso Nacional. Os tópicos a seguir sintetizam as discussões que ocorreram nos grupos de trabalho criados para identificar os principais problemas e refletir sobre eventuais melhorias na legislação que regula o pleito.

  1. Convenções e Registro de Candidatura:
  • Antecipação das Convenções Partidárias e Registros de Candidatura:

Tradicionalmente, do registro de candidatura até a data das eleições, o processo eleitoral desenvolvia-se em aproximadamente três meses. As convenções partidárias aconteciam entre 10 e 30 de junho do ano das eleições e o pedido de registro de candidatura se dava até o dia 05 de julho do ano do pleito.

Esse panorama foi alterado pela Lei nº 13.165/2015, que promoveu a redução do período eleitoral para aproximadamente 45 dias ao dar nova redação aos artigos 8º e 11 da Lei nº 9.504/97 e indicar que as convenções para escolhas de candidaturas deveriam ocorrer entre 20 de julho e 5 de agosto e que os registros de candidaturas, por sua vez, deveriam ser formalizados até 15 de agosto do ano das eleições.

A experiência de três eleições sob a égide dessas regras demonstra que a alteração não foi positiva, já que a diminuição do lapso temporal entre o registro de candidatura e a data das eleições praticamente anularam as possibilidades de um registro de candidatura ser julgado pelo TSE até a data do pleito.

O resultado prático da redução do período eleitoral foi o incremento do número de candidatos com registros sub-judice eleitos e que não podiam tomar posse do cargo público, o que decerto gera insegurança jurídica, instabilidade administrativa pela necessidade de realização de novas eleições no caso da não reversão da situação jurídica do candidato com maior votação e a sensação de frustração do eleitor.

Ademais, como será tratado adiante, o reestabelecimento dos prazos indicados nas redações originárias do art. 8º e 11 da Lei nº 9.504/97 é benéfico também para as questões afetas a propaganda eleitoral, ampliando o período de campanha.

  • Desburocratização do processo de registro de candidatura e a disponibilização de meios online para a obtenção de todas as certidões necessárias para o registro de candidatura:

Outro ponto relacionado ao Registro de Candidatura que pode ser alvo de mudança simples e extremamente positiva diz respeito à documentação exigida para o registro de candidatura. A matéria é regulada pelo art. 11º da Lei nº 9.504/97 que, em diversos parágrafos e incisos, traz um extenso rol de documentos que devem ser apresentados por ocasião do registro.

Com a evolução dos bancos de dados e dos sistemas informatizados do Poder Público em geral e da Justiça Brasileira em especial, alguns desses documentos passaram a ser gerados e trazidos aos autos de forma automática (como ocorre hoje com as certidões de filiação partidária, de domicílio eleitoral e de crimes eleitorais).

A Lei Eleitoral indica também, no art. 11, § 5º da Lei nº 9.504/97, que os Tribunais de Contas tornarão públicas aos Tribunais Regionais a relação dos que tiveram suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável e por decisão irrecorrível do órgão competente.

Existe, além disso, o Cadastro Nacional de Condenados por Atos de Improbidade Administrativa (estabelecido pela Resolução CNJ nº 44, de 20.11.2007), o que é um importante instrumento de desburocratização e efetividade do processo de registro de candidatura.

O avanço dos bancos de dados e dos sistemas informatizados da Justiça Eleitoral permite que seja dado o próximo passo nesse caminho de desburocratização dos Registros de Candidatura, tornando-se obrigatória a disponibilização de meios online para os candidatos solicitarem todas as certidões necessárias para o registro de candidatura (tanto em primeira quanto em segunda instância).

  1. Propaganda Eleitoral: 
  • Ampliação do tempo de propaganda eleitoral 

A propaganda eleitoral está inserida no direito fundamental de informar e ser informado. Isto porque “sem liberdade de manifestação, a escolha é inexistente. O que é para ser opção, transforma-se em simulacro de alternativa. O processo eleitoral transforma-se em enquadramento eleitoral, próprio das ditaduras[1]. Ela é o meio pelo qual os candidatos, partidos e coligações difundem seus programas e ideias, de forma a suscitar o debate político na sociedade, conquistar novos adeptos e garantir votos.

A redução do período de propaganda se justificava pela necessidade de redução dos custos das campanhas. De fato, até 2015 o limite de gastos tinha pouca rigidez, propiciando seguidas revisões em pleitos disputados e incentivando sucessivos aumentos de gastos. Todavia, com a determinação de um limite fixo estabelecido pelo próprio TSE (art. 18, da Le nº 9.504/97), tal justificativa não se sustenta mais.

Campanhas muito reduzidas tendem a favorecer aqueles que gozam de maior presença frente aos meios de comunicação e maior notoriedade perante o eleitorado. É necessário um maior tempo para o amadurecimento dos debates políticos no eleitorado, para que este possa conhecer os candidatos, suas propostas e melhor avaliar a quem confiará seu voto. Abreviar a discussão tolhe este direito do eleitor. Portanto, a ampliação do período para 90 dias – como tradicionalmente era no Brasil – é necessária para que o debate político seja qualificado e mais bem difundido perante o eleitorado.

  • Liberalização da propaganda antecipada com a coibição de abusos

A definição de propaganda eleitoral sempre foi um grande desafio, tanto para a doutrina[2] quanto para jurisprudência[3]. No entanto, esse problema se potencializou ainda mais com a evolução dos meios de comunicação e o advento das redes sociais. Se, por um lado, a democratização do espaço público beneficiou significativamente a liberdade de expressão, por outro, facilitou o exercício de influência sobre o eleitorado.

Há muita insegurança quanto as ações que podem ser realizadas na pré-campanha, principalmente em relação a forma de se comunicar e a eventuais gastos com redes sociais (impulsionamento de conteúdo). Atualmente, a jurisprudência sobre propaganda antecipada vai no sentido quase de uma liberação da prática, permitindo pedido de apoio, a menção a própria candidatura e a exaltação das qualidades pessoais do pré-candidato. Há, no entanto, a proibição do pedido explicito de voto. Essa vedação de conteúdo da propaganda se mostra problemática, pois abre margem para uma interpretação muito subjetiva por parte do Poder Judiciário.

Assim, tentando contribuir com uma melhor forma de regulação, propõe-se uma maior liberalização do discurso. Caso este envolva o dispêndio de recursos, estes devem ser realizados pelo partido político com sua devida escrituração contábil. Por outro lado, os abusos devem ser coibidos, desde que realmente apresentem uma afronta à isonomia do processo. A forma de combater esses abusos já estão expressos na própria legislação eleitoral, tanto o econômico quanto o dos meios de comunicação social.

  • Fim da limitação da propaganda em bens particulares:

As limitações à veiculação da propaganda em bens particulares começaram a ser impostas em 2009 e, desde então, vem sendo cada vez mais ampliadas. Na minirreforma de 2017 estabeleceu-se que, nos bens privados poderia apenas ser afixada propaganda eleitoral por meio de bandeiras ou adesivos.

Esse tipo de proibição é uma forte violação da liberdade de expressão. A propaganda eleitoral difundida de forma voluntária em imóveis particulares de uso não comum está dentro da livre manifestação do eleitor. Dentro do espaço privado, não há sentido em se limitar a possibilidade do eleitor se posicionar politicamente da forma que melhor entender, ressalvados os abusos.

Consequentemente, este direito não pode violar a sistemática da legislação eleitoral. Isto é, não pode o eleitor se valer de meio proscrito para realizar sua manifestação individual ou a efetuar mediante pagamento do candidato.

  • Crime de “boca de urna” em ambiente virtual:

O crime de “boca de urna” decorre da intenção do legislador em reprovar o exercício de influência sobre a vontade do eleitor por meio da arregimentação de pessoas para fazer propaganda eleitoral nos entornos dos locais de votação, na data do pleito. Esta prática estava muito ligada às fraudes eleitorais por meio da coação – onde grupos de pessoas impeliam ou impediam eleitores de votar de forma agressiva – ou de corrupção – por meio da compra de votos. O aprimoramento do sistema eleitoral brasileiro no combate às fraudes e a maior fiscalização por parte da Justiça Eleitoral sobre a questão contribuíram significativamente para refrear essa prática.

O crime de “boca de urna” está previsto na Lei nº 9.504/97. Todavia, há uma falta de taxatividade do tipo, que vem sendo alargado para se criminalizar eleitores que enviam, por exemplo, “santinhos” por meio virtual no dia do pleito. Este tipo de conduta, desde que não realizado por meio de dispêndio de recursos, se insere no direito de livre manifestação individual do eleitor. Há, por conseguinte, a necessidade de se estabelecer taxativamente a não ofensividade da conduta, com vistas a evitar incriminações injustas.

  • Fim das restrições para o horário eleitoral gratuito na TV:

As restrições à forma de captação de imagens e à participação de apoiadores no horário eleitoral gratuito não estavam previstas no projeto de lei que originou a minirreforma eleitoral de 2015. O art. 54, em sua redação atual, nasceu de substitutivo apresentado na Câmara dos Deputados e, posteriormente, reformado durante a tramitação do PL no Senado. A modificação se insere dentro de um período em que muito se criticava a influência do marketing político nas campanhas eleitorais, como se este tivesse o condão de distorcer a vontade do eleitor.

A coibição de abusos que tisnem a lisura do pleito deve ser sempre um objetivo da legislação eleitoral, todavia, não parece ser com o cerceamento do conteúdo das peças de propaganda eleitoral que isso será alcançado. É importante lembrar os efeitos nefastos que a Lei nº 6.339/76 – conhecida como Lei Falcão – causou no sistema político brasileiro ao cercear severamente o exercício da liberdade de expressão no horário eleitoral gratuito.

Ademais, o avanço tecnológico na captação de imagens e na forma de se produzir conteúdo para as propagandas eleitorais tornaram as restrições do dispositivo obsoletas. Da mesma forma, há uma grande incompatibilidade da margem de apoiamento com a redução do tempo de propaganda. As inserções da campanha eleitoral têm 30 segundos. Com isso, o apoiador só poderia falar por 7 segundos e meio.

  • Fim da proibição de impulsionamento da propaganda negativa na internet:

O delineamento da legislação aplicável à propaganda eleitoral na internet surgiu na minirreforma eleitoral de 2017. A vitória de Donald Trump nas eleições de 2016 nos EUA – marcada por uma forte campanha de ataque a sua opositora, Hillary Clinton, por meio da internet e das redes sociais – foi preponderante para opção do legislador brasileiro. O intuito era coibir uma polarização negativa do eleitorado, impedindo uma campanha de ataques mútuos e incentivando um debate profícuo de propostas.

Todavia, as distinções entre o sistema eleitoral – especialmente no que concerne a propaganda – entre os EUA e o Brasil são muito grandes. Não há lógica na possibilidade de se realizar propaganda negativa no horário eleitoral gratuito na TV e rádio, ou mesmo pagar uma propaganda negativa contra adversário em jornal, e não se poder fazer o mesmo no ambiente virtual. O TSE, em decisão recente, adotou a compreensão de que impulsionamentos com o nome de candidatos adversários, com vistas a fazer comparativo entre eles, não constitui propaganda negativa[4]. Assim, realizar a mesma propulsão com críticas – mesmo que ácidas ou duras ao adversário, porém lícitas – não prejudica a normalidade do pleito.

É importante repisar que o fim da proibição de impulsionamento de propaganda negativa não significa o “vale-tudo” em ambiente virtual, tendo em vista que as restrições a propagandas que caluniem, difamem ou injuriem adversários continuam vigentes (art. 243, IX, do Código Eleitoral).

  • Criação de uma biblioteca de propagandas pagas na internet:

A diversidade de mídias digitais por meio das quais se pode transmitir propaganda eleitoral é cada vez maior. A legislação eleitoral acaba por sempre estar um passo atrás da inovação tecnológica utilizada nas campanhas eleitorais. Restringir a possibilidade de realizar propaganda paga aos mecanismos de impulsionamentos das grandes plataformas (como Google e Facebook) acaba aprofundando o monopólio dessas empresas no ramo. É necessário diversificar a possibilidade de anunciar em mais ambientes do que apenas nas ferramentas de impulsionamento. Por outro lado, surge a questão de como seria possível regulamentar e dar transparência para essa forma de difusão paga de propaganda eleitoral, vez que não são todas as plataformas que dispõe dos mecanismos de controle das Big Techs.

Um modelo possível poderia ser inspirado na própria forma do financiamento eleitoral atual. As alterações nas exigências das prestações de contas fizeram com que exista a necessidade de informar a Justiça Eleitoral de qualquer movimentação nos recursos de campanha. O legislador impôs o ônus a partidos, candidatos e coligações de apresentarem informações sobre os valores arrecadados em até 72h de seu recebimento por meio do SPCE. Da mesma forma, todos os gastos devem ser contabilizados, com a devida identificação do recebedor.

Assim, como toda a propaganda produzida no curso da campanha eleitoral deverá ter seus custos de confecção escriturados na respectiva prestação de contas, poderia se demandar dos candidatos que depositem – em sítio eletrônico a ser criado pela Justiça Eleitoral – as peças de propaganda que serão difundidas pela internet. O avanço tecnológico do processo eletrônico e da Justiça Eleitoral possibilitam a agregação de imagens, vídeos e gravações de som em ambiente virtual. Ficaria a cargo dos candidatos, partidos e coligações prestarem informações sobre onde, quando e como determinada propaganda foi exibida, sob pena de multa quando não o fizerem. Isso facilitaria a transparência e a fiscalização da licitude da propaganda eleitoral, bem como permitiria que seu uso fosse mais bem disseminado em outras plataformas.

  • Reforma do crime de contratação de “língua de aluguel virtual”:

A prática alcunhada de “língua de aluguel” consiste na contratação de duas ou mais pessoas para ofender a honra e aviltar a reputação de um determinado candidato em público, de forma a se criar a falsa impressão de que há um consenso negativo quanto a este. Era muito comum que duas pessoas entrassem em um ônibus e ficassem tecendo críticas (lícitas ou ilícitas) a candidatos, buscando que os demais passageiros as ouvissem e assimilassem como verdadeiras.

Com as inovações tecnológicas, esta prática passou a ocorrer, de forma semelhante, no ambiente virtual. A estratégia perpassa pela aquisição de perfis em redes sociais para a difusão desinformação e discurso de ódio com o falseamento do nível de engajamento. Isso faz com que o conteúdo irregular atinja uma maior quantidade de pessoas no ambiente virtual, criando a irreal sensação de que determinado candidato está sendo criticado ou atacado. A intenção criminosa por trás dessa conduta está na tentativa de se criar uma massificação falsa a respeito de determinado conteúdo, o que pode macular a lisura e a normalidade do pleito.

Essa conduta já consubstancia crime, previsto no art. 57-H, §1º da Lei nº 9.504/97. Entretanto, a forma como o tipo está redigido – responsabilizando criminalmente aqueles que contratam grupo de pessoas para aviltar a honra e a imagem de candidato – não permite o correto enquadramento desse falseamento. Assim, é necessária uma alteração na redação da hipótese incriminadora, de forma a torná-la efetiva.

  • Competência da Justiça Eleitoral para processar infrações relacionadas a dados pessoais: 

A legislação não dispõe sobre a aplicação da LGPD (Lei nº 13.709/18) no processo eleitoral. Coube ao TSE estabelecer, por meio de Resolução, como se daria a utilização e a proteção de dados pessoais nas campanhas (art. 31 e 41 da Res./TSE nº 23.610). A falta de previsão legal, todavia, cria uma insegurança sobre qual é o órgão competente para fiscalizar e sancionar eventuais infrações à LGPD, se a Justiça Eleitoral ou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados.

Seguindo a sistemática da interpretação constitucional brasileira, compete à Justiça Eleitoral decidir sobre as contendas relacionadas ao pleito, mesmo que estas digam respeito a matérias não essencialmente eleitorais. Esse entendimento se traduz, por exemplo, na recente reafirmação por parte do STF de que o julgamento de crimes conexos aos eleitorais são de competência da Justiça Eleitoral[5] ou na jurisprudência histórica do TSE que legitima esta justiça especializada a deliberar sobre eventuais afrontas a direitos autorais na propaganda eleitoral[6].

A despeito disso, é necessário que haja uma cooperação técnica entre a ANPD e a Justiça Eleitoral. Da mesma forma com que ocorre com Tribunais de Contas, Receita Federal e outros órgãos administrativos, é preciso que seja estabelecido um intercâmbio de informações entre as duas instituições, com vistas a garantir a efetividade da proteção dos dados pessoais.

Dessa forma, propõe-se um artigo que estabeleça a competência da Justiça Eleitoral para processar e julgar eventuais infrações à LGPD no âmbito das campanhas eleitorais.

  1. Financiamento eleitoral e prestação de contas:
  • Retorno das doações de empresas:

O STF não fechou as portas para a possibilidade de retorno do financiamento político-partidário-eleitoral por meio de doações de empresas. O que a Corte decidiu foi que a modelagem jurídica até então vigente permitia o abuso do poder econômico e a quebra da isonomia, pois pouquíssimas empresas concentravam a maior parte dos valores doados e, ainda, pulverizavam as suas doações, direcionando-as para partidos e candidatos que muitas vezes eram adversários.

Posteriormente ao julgamento, o Ministro Relator afirmou, durante entrevista, que o financiamento da política por empresas “poderia ser repensado”, no sentido de que fosse vinculado com as ideias afetas a cada pessoa jurídica, enfatizando que o STF decidiu pela inconstitucionalidade diante da postura de pessoas jurídicas que contribuíam para inúmeros candidatos e partidos políticos com o escopo de obter contrapartidas futuras.

Durante sua participação no VI Congresso de Direito Eleitoral Brasileiro, o Ministro Luís Roberto Barroso reiterou aquilo que já havia constado de seu voto proferido quando do julgamento da ADI nº 4650, no sentido de que não entendia inconstitucional qualquer possibilidade de participação de pessoas jurídicas no financiamento eleitoral e que a matéria não se encontrava fechada para o legislador. Poderia ser pensada uma regulamentação diversa daquela que permitia doações realizadas a inúmeros candidatos e partidos políticos, bem como conjugado o financiamento por pessoas jurídicas com a adoção da lista fechada, de acordo com Barroso.

Na tentativa de restabelecer a possibilidade de doações de empresas, já se propôs:

(i) o estabelecimento de um novo regramento legal, que vedasse práticas abusivas como a pulverização de doações, entre candidatos e partidos adversários.

(ii) a adoção de tetos de doações nominais e baixos. Seria necessário que o valor não se referisse a um percentual do faturamento das empresas, para evitar que fossem geradas desigualdades a partir do poderio econômico das diferentes pessoas jurídicas.

Com a mesma finalidade de evitar desigualdades, deveria ser pensado num teto nominal que se adequasse à realidade das empresas brasileiras em geral, para que todas aquelas que quisessem doar, pudessem, se pretendessem, atingir o teto de doações. Ou seja, o limite não poderia ser alto demais a fim de que as pessoas jurídicas em geral não tivessem a possibilidade de alcançar o teto em valor de doações, se assim o desejassem;

(iii) que os tetos de doações se aplicassem a todo o grupo econômico, para evitar que a utilização de múltiplos CNPJs permitisse que a estrutura societária tivesse um acesso mais amplo aos mandatários. Um dos pontos negativos do modelo de doações por pessoas jurídicas vigente até 2015 era a possibilidade de utilização de CNPJs distintos, de empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico, para assim se atingir um volume maior de doações;

(iv) a criação de medidas que estimulassem a realização de doações baixas pelo maior número possível de financiadores, para evitar qualquer possibilidade de concentração das contribuições em poucas pessoas físicas ou jurídicas. Os dados dos pleitos anteriores demonstram que um percentual muito baixo de pessoas físicas e jurídicas (quando admitidas) realizaram doações eleitorais ao longo dos anos.[7]

Nos debates da comissão, o retorno das doações empresariais com tetos nominais baixos foi amplamente apoiado. Por outro lado, a proibição de doações para candidatos adversários gerou uma certa polêmica, havendo discordâncias a respeito. Nesses termos, propomos as seguintes alternativas redacionais:

  1. a) Art. XX. As pessoas jurídicas podem realizar doações a candidatos e partidos políticos, desde que respeitado o teto nominal de R$ XX.
  • 1º Tratando-se de doação para candidato, incide também o limite de XX% do teto de gastos estabelecido para o cargo em disputa.
  • 2º Nas eleições majoritárias, fica vedada a realização de doações a candidatos e partidos adversários.
  1. b) Art. XX. As pessoas jurídicas podem realizar doações a candidatos e partidos políticos, desde que respeitado o teto nominal de R$ XX.

Parágrafo único. Tratando-se de doação para candidato, incide também o limite de XX% do teto de gastos estabelecido para o cargo em disputa.

  • “Recuperação judicial” dos partidos políticos:

As dívidas das agremiações possuem atualmente várias naturezas jurídicas distintas: a) débitos com fornecedores, cuja competência para julgamento pertence à Justiça Estadual; b) débitos tributários que, em regra, são de competência da Justiça Federal; e c) débitos decorrentes de condenações a ressarcimento de valores por recebimento de doações de fontes vedadas, recursos de origem não identificada e irregularidade na aplicação de recursos do Fundo Partidário e do FEFC; tais obrigações são fixadas em processos de competência da Justiça Eleitoral e, muitas vezes, satisfeitas de maneira parcelada em tais processos.

Seria preciso discutir uma alternativa para que as dívidas, independentemente de sua origem, pudessem, eventualmente serem quitadas em um processo único de concurso de créditos, tal qual ocorre com a recuperação judicial, sob competência da Justiça Eleitoral.

Em tal procedimento, poderiam ser previstos mecanismos para facilitação da quitação das obrigações (ex.: parcelamentos, sem a incidência de juros).

  • Quitação de débitos decorrentes de julgamento de prestações de contas:

As Resoluções TSE nº 23.604/19 e 23.607/19 preveem a incidência de atualização e juros nos recolhimentos a serem realizados pelo recebimento de recursos de fonte vedada, origem não identificada e aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário e do FEFC (art. 59, § 1º, 31, § 1º e 32, § 3º). Não há previsão legal para a incidência de juros sobre tais débitos, seja na Lei dos Partidos Políticos, seja na Lei das Eleições. O ideal seria apenas a incidência de correção monetária, a fim de preservar o valor real do débito, sem a aplicação de juros. 

  • Impenhorabilidade do Fundo Partidário e do FEFC:

Não obstante o Código de Processo Civil preveja que os recursos do Fundo Partidário são impenhoráveis (art. 833, XI), inúmeras decisões judiciais acabam flexibilizando o dispositivo, sob o entendimento de que tais recursos podem ser penhorados para fins de satisfação de dívidas contraídas em eleições:

Destinando-se também ao custeio da campanha e da propaganda eleitoral, os recursos do fundo partidário são penhoráveis no cumprimento de sentença em monitória por remuneração de contrato de prestação de serviço. Nas circunstâncias, porém, reduz-se o percentual à metade[8].

O STJ tem decidido que a impenhorabilidade dos recursos do Fundo Partidário é absoluta[9]. Ainda assim, existe muita insegurança com relação à matéria. E não há previsão expressa quanto à impenhorabilidade de recursos do FEFC. Por óbvio, o art. 833, XI, do CPC deveria ser aplicado por analogia para abarcar também o FEFC, especialmente considerando que tais recursos apenas podem ser utilizados na eleição específica do exercício financeiro em que foram previstos.

A impenhorabilidade absoluta do Fundo Partidário foi questionada a reunião realizada para apresentação das propostas iniciais. De acordo com intervenção do membro consultor Ricardo Penteado, isso representaria um tratamento extremamente benéfico e exclusivo aos partidos políticos.

A crítica apresentada não se refere ao FEFC, que tem destinação exclusiva vinculada a uma determinada eleição. Não poderiam, portanto, tais recursos serem utilizados para o pagamento de despesas não relacionadas ao pleito que deu ensejo à destinação dos recursos do FEFC.

Nesse sentido, apresentamos as seguintes propostas de redação legislativa:

  1. a) XX. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha são absolutamente impenhoráveis, independentemente da origem da obrigação.

Justificativas: vinculação dos recursos do Fundo Partidário à manutenção da estrutura ordinária das agremiações e do FEFC à utilização em uma eleição específica. Além disso, os recursos vindos de origem privada podem ser penhorados.

  1. b) XX. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha são absolutamente impenhoráveis, independentemente da origem da obrigação.

Parágrafo único. Eventuais determinações judiciais que incidam sobre o Fundo Partidário não poderão ensejar o recolhimento das quantias indisponibilizadas ou penhoradas ao Tesouro Nacional.

Justificativa: por vezes, após a penhora de valores do Fundo Partidário, os partidos ainda são condenados a recolher o valor correspondente à penhora ao Tesouro Nacional. Isso ocorre nos processos de prestações de contas anuais, sob o fundamento de que o Fundo Partidário não poderia ser penhorado e acaba gerando uma penalização descabida aos partidos, que compromete a contabilidade das agremiações, onerando-as duas vezes a partir do mesmo débito. 

  • Controle concomitante das movimentações de campanha e indícios de irregularidade:

Relativamente à entrega das prestações de contas eleitorais dos partidos políticos, é importante lembrar que a legislação de regência prevê: a) o envio de relatório financeiro de campanha, no prazo de setenta e duas horas, no caso de recebimento de recursos financeiros, contados do respectivo crédito na conta bancária de campanha (art. 28, § 4º, inciso I, da Lei nº 9.504/97); b) a prestação de contas parcial, a ser enviada entre 9 e 13 de setembro, contendo toda a movimentação de recursos arrecadados e aplicados em campanha até 8 de setembro de maneira detalhada (art. 50, § 4º, da Res. TSE nº 23.553/17); c) a entrega da prestação de contas final até 30 dias após a realização da eleição (art. 29, inciso III, da Lei nº 9.504/97).

Os relatórios financeiros, as prestações de contas parciais e as prestações de contas finais são todas divulgados pelo TSE na Internet por meio do DivulgaCandContas. O sistema condensa dados desde a eleição de 2002.

Sob o ponto de vista da transparência e do voto informado, os relatórios financeiros e as prestações de contas parciais são instrumentos relevantíssimos, pois a divulgação dos dados correspondentes permite que os cidadãos tenham conhecimento sobre quem são os financiadores e os fornecedores das campanhas eleitorais antes da realização das eleições.

Por outro, a Justiça Eleitoral iniciou a partir das Eleições de 2016 o cruzamento de dados antes mesmo da realização das eleições, com o escopo de verificar eventuais indícios de irregularidade nas arrecadações e gastos de campanha, tomando por base o envio dos relatórios financeiros de campanha e das prestações de contas parciais e informações constantes de bancos de dados públicos. Isso foi possível a partir do previsto nos artigos 80 e 81 da Resolução TSE nº 23.463/2015, de acordo com os quais a Justiça Eleitoral poderia iniciar a análise das movimentações de recursos durante as campanhas eleitorais, sendo os órgãos da administração pública direta e indireta obrigados a fornecer as informações nas suas áreas de competência quando requisitadas pela justiça especializada.

Criou-se então o Núcleo de Inteligência da Justiça Eleitoral, com o escopo de promover a cooperação técnica entre do TSE, dos TREs, do Ministério Público Federal (MPF), da Polícia Federal, do Tribunal de Contas da União (TCU), da Receita Federal do Brasil (RFB) e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) e permitir os cruzamentos entre os dados mencionados, com o escopo de identificar possíveis indícios decorrentes de situações como indícios de falta de capacidade operacional de fornecedores e falta de capacidade econômica de doadores de campanha e, ainda, de possíveis doações indiretas provenientes de pessoas jurídicas. Todos os cruzamentos foram realizados de maneira informatizada, a partir de tipologias definidas pelo Núcleo de Inteligência da Justiça Eleitoral.

Com base ainda em acordo de cooperação técnica com o COAF foi possível verificar os relatórios de movimentações financeiras atípicas relacionados a prestadores de contas eleitorais.

No que se refere aos indícios de irregularidade, nas Eleições de 2016 foram levantadas cerca de 260.000 situações suspeitas, comunicadas pelo TSE ao julgador competente para análise das contas de campanha para que pudesse realizar a filtragem preliminar dos indícios relevantes e determinar as investigações que fossem necessárias, caso constatada alguma situação em que os indícios detivessem materialidade e relevância, nos termos da Instrução Normativa TSE nº 18/2016.

Após a filtragem inicial ou mesmo na fase das investigações, muitos indícios não se confirmaram como irregularidades, todavia, os cruzamentos permitiram a realização de investigações e de verificação de situações que constituíam irregularidades, repercutindo negativamente no julgamento das contas de campanha em que ocorreram tal situação.

Fato é que o número total de indícios tem sido divulgado sem qualquer filtragem prévia (ex vi: https://bityli.com/W2wUv e https://bityli.com/FcM9Q, acesso em 16 abr. 2021), de modo que os falsos positivos engrossam os dados e levam a impressão de que há muito mais irregularidades do que de fato existem. É preciso repensar essa forma de divulgação, seja para esclarecer que os números são divulgados de maneira bruta, seja para que se divulgue também o número de falsos positivos. Isso porque a divulgação dos dados sem qualquer checagem prévia e sem os esclarecimentos contribui para a criminalização do financiamento eleitoral.

  • Aperfeiçoamento das Notas fiscais:

Outro importante instrumento para a transparência e a análise das prestações de contas de campanha são as notas fiscais eletrônicas relativas a gastos eleitorais. O artigo 92 da Resolução TSE nº 23.607/2019 determina que a secretaria da Receita Federal do Brasil e as secretarias estaduais e municipais da Fazenda encaminhem ao TSE pela internet as notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais.

As informações correspondentes divulgadas por meio do DivulgaCandContas e utilizadas em cruzamentos de dados quando da análise das prestações de contas de campanha com o escopo de verificar despesas não declaradas ou inconsistências entre as informações declaradas e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas a partir das notas fiscais eletrônicas.

Ocorre, contudo, que a previsão de disponibilização não consta de lei, mas apenas das resoluções produzidas pelo TSE, sendo comum que alguns entes federativos dificultem o fornecimento das informações. Assim, o ideal seria que a disponibilização das notas fiscais eletrônicas fosse prevista na Lei das Eleições e na Lei dos Partidos Políticos.

Outrossim, deveria ser previsto um procedimento para confirmação da contratação referente às notas fiscais não declaradas por candidatos e partidos políticos. Isso porque, não raro as campanhas ou partidos não reconhecem o documento e isso gera o apontamento de irregularidade com base em mera presunção.

Considerando que a nota fiscal, em regra, deve ser aceita pelo consumidor, poderia ser enviado pedido de confirmação ao fornecedor, a fim de que no prazo de 3 dias ele apresentasse o aceite da nota ou outro meio comprobatório da contratação. Não sendo comprovado o aceite ou a contratação por documento apresentado pelo fornecedor, as informações constantes da nota fiscal não poderiam ser utilizadas em desfavor de candidatos e partidos políticos.

  • Extratos eletrônicos – aperfeiçoamento:

Também contribuindo com a transparência e a análise das prestações de contas, os extratos eletrônicos das contas utilizadas para a movimentação de recursos de campanha e para a manutenção ordinária dos partidos políticos devem ser disponibilizados pelas instituições bancárias ao TSE, nos termos do art. 6º, § 6º, da Res. TSE nº 23.604/19 e do art. 13, da Res. TSE nº 23.607/19. Uma vez recepcionados pelo TSE, os extratos são disponibilizados para consulta pública no DivulgaCandContas.

A fim de garantir o envio dos extratos pelos bancos, o ideal seria que houvesse previsão legal para tanto, pois atualmente isso consta apenas de atos infralegais. Outrossim, é fundamental que os extratos disponibilizados também possam ser utilizados em benefício de candidatos e partidos políticos, não podendo os prestadores de contas serem penalizados pela ausência de juntada de extrato nas respectivas prestações de contas, quando os documentos sejam remetidos à Justiça Eleitoral pelas instituições bancárias.

  • Melhorias nos mecanismos de análise das contas eleitorais:

Para otimizar a análise das prestações de contas finais, a Justiça Eleitoral utiliza o Sistema de Prestação de Contas Eleitoral – módulo Análise (SPCE Análise), desenvolvido a partir da conjugação de esforços entre Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidária (ASEPA) e da Secretaria de Tecnologia da Informação (STI), ambas do TSE, com o auxílio, ainda, de servidores de TREs, convocados ou designados para auxiliar aos trabalhos.

A ASEPA coordena o trabalho no sentido de preparar as regras de negócio que serão utilizadas na análise das prestações de contas, padronizando os Procedimentos Técnicos de Exame (PTE) e a STI cria os algoritmos correspondentes.

Com base nesse trabalho, as prestações de contas eleitorais são processadas a partir de cruzamento entre, de um lado, as informações declaradas pelo partido ou candidato e, de outro, as informações declaradas por outros prestadores de conta, dados da Receita Federal do Brasil, informações de notas fiscais eletrônicas, informações prestadas por doadores e fornecedores de campanha, extratos bancários eletrônicos etc.

Após os cruzamentos informatizados, que otimizam e trazem eficiência à análise das contas, gera-se um relatório a partir do qual o analista das contas iniciará o seu trabalho, filtrando as informações constantes do relatório antes de diligenciar o prestador de contas para que ele preste os esclarecimentos e apresente os documentos necessários ao exame das contas.

Ao contrário das minutas das Resoluções, que são discutidas com a sociedade, partidos e no Plenário do TSE antes de suas aprovações, as regras de análise acabam sendo definidas pelo grupo de trabalho. O ideal seria que houvesse uma previsão de discussão das regras de análise sempre que houvesse alterações significativas seja nas regras de negócio, seja na legislação, de uma forma que não prejudicasse a finalidade do trabalho de auditoria das contas.

Isso porque muitas vezes as regras de análise acabam condicionando a apreciação das contas em aspectos sensíveis, sujeitos a mais de uma interpretação, quando os julgadores se fiam exclusivamente nas regras do sistema.

  • Vedação a determinação de recolhimento de valores com base em presunções e juízos abstratos:

Inúmeras vezes imputa-se aos partidos políticos e candidatos a obrigação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional com base em presunções e juízos abstratos. Considera-se, por exemplo, que a ausência de apresentação de todos os documentos para a comprovação da exigibilidade de dívidas registradas nos passivos dos partidos gera a presunção da utilização de recursos de origem não identificada para a quitação dos débitos, ainda que eles constem do balanço das agremiações como em aberto[10].

Do mesmo modo, considera-se que despesas de campanha supostamente não declaradas foram quitadas com recursos que não transitaram pela conta bancária de campanha.

Ocorre que esse tipo de posicionamento desconsidera que não é possível se decidir com base em valores abstratos e sem se considerar os efeitos práticos da decisão, nos termos do art. 20, da LINDB, especialmente quando se determina o recolhimento de somas consideráveis de valores ao Tesouro Nacional, com base em meras presunções.

Ressalte-se, inclusive, que não há previsão legal para que ocorra esse tipo de condenação. Assim, propõe-se que seja estudada regra que impeça a determinação de recolhimentos a título de recursos de origem não identificada com base em meras presunções.

  1. Candidaturas Femininas: 

A legislação que prevê as cotas de candidaturas por gênero nas eleições proporcionais existe desde 1995, e apesar de ter passado por sucessivas alterações ainda não foi suficiente para garantir o ingresso das mulheres no espaço político brasileiro.

Muito embora a lei 9.504/97 em seu artigo 10, parágrafo 3º garanta textualmente “reserva de sexo” para as listas abertas de candidaturas proporcionais, o que fatalmente constatamos é que a reserva se dá para o gênero feminino já que são as mulheres aquelas que não possuem as mesmas condições de lograrem-se eleitas.

O tímido avanço no número de mulheres no parlamento se deu pela tentativa de equiparação das oportunidades na corrida eleitoral, fazendo com que os índices de mulheres eleitas nas esferas legislativas que girava em torno de 5% (eleições de 1994, 1998 e 2002), 10% (eleições de 2006, 2010, 2014 e 2016) saltasse para 15% (eleição de 2018) e 16% (eleição de 2020) mediante a vigência de regras de aparição na propaganda eleitoral gratuita e financiamento público de campanha.

O aumento no número de eleitas demonstra que o financiamento de campanha (investimento) e a aparição na propaganda eleitoral gratuita (visibilidade), são fatores determinantes na disputa eleitoral, embora o Brasil continue ostentando a pior posição na América Latina nos índices de participação feminina nestes espaços de Poder.

Cotejando os dados do IBGE e TSE que demonstram serem as mulheres 51,7% da população brasileira, 52% do eleitorado e 44% das filiações partidárias há que se perquirir o porquê estas não se encontram devidamente representadas nos Poderes Legislativos, e menos ainda nos Poderes Executivos (atualmente a ocupação feminina no legislativo municipal remonta 16%, melhor cenário desde a existência da legislação de cotas).

Um dos motivos pode ser descrito como a ausência de democracia intrapartidária de modo que a utilização e ferramentas de inserção nestes espaços políticos é de fundamental importância, garantindo acesso das mulheres nas diretorias e executivas partidárias.

Da mesma maneira torna-se imperioso cotas de candidaturas paritárias nas eleições majoritárias ou ainda a reserva de assento, por período pré-determinado, nos legislativos brasileiros.

A paridade de cargos deve se aplicar igualmente à composição da mesa diretora e nas comissões temáticas das Casas Legislativas.

No que diz respeito ao prazo propaganda eleitoral, referido prazo deve ser elastecido haja vista que a visibilidade na construção da candidatura é magistralmente importante para a eleição e como culturalmente as mulheres ainda são minorias nos espaços de poder, o aumento no prazo de propaganda angaria maiores chances de sucesso na corrida eleitoral.

O mesmo se aplica quanto ao prazo da arrecadação via crowfundig, já que a possibilidade de maior tempo de arrecadação de recursos particulares aumenta a quantidade de recursos que pode ser investido em determinada candidatura, uma vez que quando se trata desta modalidade de recursos, os homens ainda são os que mais arrecadam.

Quanto à reserva do Fundo Especial de Financiamento de Campanha é importante que se garanta acesso apenas às mulheres candidatas ao sistema proporcional, eliminando desta maneira o repasse de dinheiro público às campanhas majoritárias onde os homens ostentam o cargo principal e a mulher ostenta a vice candidatura.

Finalmente é necessário a discussão acerca da violência política de gênero.

Para além de uma corrida eleitoral desigual, as eleitas enfrentam uma nova realidade que tenta extirpá-las da política.

Oscilando muitas vezes entre os micros e macros machismos é extremamente comum que as políticas experimentem mais uma forma de violência quando sofrem tentativas de silenciamento em seus mandatos, quando suas opiniões não são levadas em consideração, quando são descreditadas, sexualizadas, recebem ameaças de cassações e representações como estas infundadas, em evidente prática de violência política de gênero.

Caracterizada como todo e qualquer ato com o objetivo de excluir a mulher do espaço político, a violência política de gênero ganha contornos ainda maiores quando as mulheres passam a ocupar os espaços públicos antes apenas garantidos aso homens, vitimando não apenas as eleitas, mas também a democracia.

  1. Sugestões de redação legislativa:

Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997

Art. 8º. A escolha dos candidatos pelos partidos e a deliberação sobre coligações deverão ser feitas no período de 10 a 30 de junho do ano em que se realizarem as eleições, lavrando-se a respectiva ata em livro aberto, rubricado pela Justiça Eleitoral, publicada em vinte e quatro horas em qualquer meio de comunicação.

***

Art. 10.  Cada partido ou coligação poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 150% (cento e cinquenta por cento) do número de lugares a preencher, salvo:

  • 3o Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá 50% para candidaturas de cada gênero.

***

Art. 11. Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as 23 horas e 59 minutos do dia 05 de julho do ano em que se realizarem as eleições.

  • 1º-A. Os Tribunais de Justiça dos Estados, os Tribunais Regionais Federais e os Tribunais de Justiça Militar deverão disponibilizar em seus sítios da internet meios e canais para a solicitação e obtenção de todas as certidões de distribuição e de objeto e pé, tanto de primeiro quanto de segundo grau, necessárias para o registro de candidatura.

***

Art. 36. A propaganda eleitoral é somente permitida após o dia 5 de julho do ano da eleição.

  • 1º. Considera-se como propaganda eleitoral, para fins desta lei, todas as técnicas lícitas para influenciar a vontade do eleitor produzidas, difundidas ou divulgadas mediante a utilização de recursos da campanha eleitoral, observado o art. 22.

***

Art. 36-A. É livre a manifestação sobre as pretensas candidaturas, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e o pedido de voto antes do período de propaganda eleitoral, podendo somente ser realizada mediante o uso dos recursos do partido político, sendo vedado o uso indevido dos meios de comunicação social.

Parágrafo único. É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social.

Art. 36-B.  Será considerado uso indevido dos meios de comunicação social, por parte do Presidente da República, dos Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal, divulgação de atos que denotem propaganda política ou ataques a partidos políticos e seus filiados ou instituições por meio de redes de radiodifusão

***

Art. 37.  (…)

  • 2º Em bens particulares, independe da obtenção de licença municipal e de autorização da Justiça Eleitoral, a veiculação de propaganda eleitoral por meio da fixação de faixas, bandeiras, adesivos, placas, cartazes, pinturas ou inscrições, desde que tenha autorização expressa do proprietário ou responsável pelo imóvel e não se valha de meio proscrito para sua realização, sujeitando-se o infrator às penalidades previstas no § 1º.

***
Art. 39. (…)

  • 5º Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR:

(…)

II – a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna;

  1. Não constitui propaganda de boca de urna o mero pedido de voto ou de apoio no dia da eleição por meio virtual pelo eleitor quando este não envolver dispêndio de recursos.

***

Art. 57-C.  É permitida a propaganda paga na internet, desde que identificada de forma inequívoca como tal, contratada exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes e que seja depositado o anúncio e suas respectivas informações em sistema criado pela Justiça Eleitoral para fins de transparência.

  • 1º O dever de depósito de que trata o caput será regulamentado pela Justiça Eleitoral, que criará sistema específico para esse fim na rede mundial de computadores que receberá e divulgará publicamente as mídias, o gasto, informações sobre o fornecedor de espaço publicitário e sobre a audiência contratada, em até 48 (quarenta e oito) horas depois de sua veiculação.
  • 2º É vedada, ainda que gratuitamente, a veiculação de propaganda eleitoral na internet, em sítios:

I – de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos, ressalvado o previsto no caput;

II – oficiais ou hospedados por órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

  • 3º A violação do disposto neste artigo, inclusive a falha no dever de depósito, sujeita o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa.
  • 4º Os anúncios de que tratam o caput deste artigo deverão ser contratados diretamente com empresa com sede e foro no País, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no País.

***
Art. 57-H.  (…)

  • 1º Constitui crime a contratação direta ou indireta de serviço que opere nas redes sociais para falsear a percepção do público a respeito do engajamento ou da popularidade de conteúdos na internet sobre candidato, partido ou coligação, punível com detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).
  • 2º Para efeitos do caput, considera-se o falseamento da percepção do público a respeito do engajamento ou da popularidade de conteúdos nas redes sociais o incremento de suas métricas e indicadores a partir de meios ocultos aos demais usuários ou alheios às suas funcionalidades por elas disponibilizadas.

***

Art. 57-L. Compete à Justiça Eleitoral processar e julgar eventuais infrações à Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, ocorridas em função do processo eleitoral ou que afetem sua lisura.

Parágrafo único. Para subsidiar os processos de que trata este artigo, a Justiça Eleitoral poderá requisitar apoio técnico da Autoridade Nacional de Proteção de Dados no fornecimento de informações e parâmetros.

Lei nº 9.096, de 19 de Setembro de 1995

Art. 15. O Estatuto do partido deve conter, entre outras, normas sobre:

(…)

IV – modo como se organiza e administra, com a definição de sua estrutura geral e identificação, composição e competências dos órgãos partidários nos níveis municipal, estadual e nacional, duração dos mandatos e processo de eleição dos seus membros, devendo ser reservado 50% de vagas para cada gênero, nos respectivos órgãos internos dos partidos políticos, sob pena de indeferimento da anotação pela Justiça Eleitoral.

Doações de pessoas jurídicas:

  1. a) Art. XX. As pessoas jurídicas podem realizar doações a candidatos e partidos políticos, desde que respeitado o teto nominal de 200 (duzentos) salários-mínimos.
  • 1º Nas eleições majoritárias, fica vedada a realização de doações a candidatos e partidos adversários.
  • 2º Eventual grupo econômico possui limite de doações único, vedando-se que a utilização de mais de um CNPJ implique no desrespeito do valor previsto no caput.

ou

  1. b) Art. XX. As pessoas jurídicas podem realizar doações a candidatos e partidos políticos, desde que respeitado o teto nominal de 200 (duzentos) salários-mínimos.

Parágrafo único. Eventual grupo econômico possui limite de doações único, vedando-se que a utilização de mais de um CNPJ implique no desrespeito do valor previsto no caput.

Impenhorabilidade de recursos públicos:

  1. a) Art. XX. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha são absolutamente impenhoráveis, independentemente da origem da obrigação.

ou

  1. b) Art. XX. Os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha são absolutamente impenhoráveis, independentemente da origem da obrigação.

Parágrafo único. Eventuais determinações judiciais que incidam sobre o Fundo Partidário não poderão ensejar o recolhimento das quantias indisponibilizadas ou penhoradas ao Tesouro Nacional.

Art. XX. Nos recolhimentos a serem realizados por candidatos e partidos políticos, em virtude de determinações proferidas pela Justiça Eleitoral, incidirá apenas correção monetária.

Art. XX. A Receita Federal do Brasil, as Secretarias Estaduais e Municipais da Fazenda devem disponibilizar as notas fiscais eletrônicas de gastos realizados por partidos políticos e candidatos à Justiça Eleitoral, na forma regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

  • 1º Verificando a ocorrência de despesas constantes das notas fiscais não declaradas nas prestações de contas, a Justiça Eleitoral deve notificar:

I – O prestador de contas, para que apresente esclarecimentos;

II – O fornecedor para que apresente o aceite da nota fiscal ou outro documento comprobatório da contratação.

  • 2º Os esclarecimentos e informações devem ser prestados no prazo de três dias.
  • 3º Em caso de negativa de contratação pelo candidato ou partido político e de ausência de comprovação do aceite ou de apresentação de outro documento comprobatório da contratação pelo fornecedor, as informações constantes da nota fiscal não podem ser utilizadas em prejuízo do prestador de contas.

Art. XX. As instituições bancárias devem enviar os extratos eletrônicos das contas bancárias de candidatos e partidos políticos à Justiça Eleitoral, na forma regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

  • 1º O descumprimento da obrigação, gerará a aplicação de multa diária entre R$ XX e R$ XX.
  • 2º Enviados os extratos eletrônicos na integralidade, os candidatos e partidos estarão desobrigados de juntarem tais documentos nas respetivas prestações de contas.
  • 3º Constatado no exame técnico que há extratos não disponibilizados pelas instituições bancárias, os prestadores de contas serão diligenciados para que os apresentem no prazo de três dias.

Art. XX. Não poderão ser determinados recolhimentos, de qualquer natureza, nas prestações de contas anuais e eleitorais, com base em presunções e juízos abstratos.

LEI 9.504/97

Nova redação ao artigo 25:

Art. 25. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente na sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento), sem prejuízo de responderem os candidatos beneficiados por abuso do poder econômico.

LEI 9.096/95

Acréscimo:

Art. 37 (…)

  • 16 Poderão ser utilizados recursos do Fundo Partidário para o pagamento da sanção de devolução prevista no caput, bem como da multa arbitrada em razão da desaprovação de contas.

Reserva de Cadeiras:

Projeto[11] de Lei Complementar n._____________________________

Altera as leis nºs Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral para acrescentar o parágrafo único ao art. 84, e a lei complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993 – Disciplina a fixação do número de Deputados para acrescentar o art. 3-A

Art. 1º – Esta Lei altera as Leis nºs 4.737, de 15 de julho de 1965 e Lei Complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993.

Art. 2º – A Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 84 – ………………

Parágrafo único: No mínimo 50% (cinquenta por cento) do número de vagas para vereadores serão preenchidas por representantes femininas, sendo 25% (vinte e cinco por cento) desses 50% (cinquenta por cento) para representantes femininas negras.”

Art. 3º – A Lei Complementar nº 78, de 30 de dezembro de 1993 passa a vigorar com a seguinte alteração:

“Art. 3-A – No mínimo 50% (cinquenta por cento) do número de vagas para deputados federais, estaduais e distritais serão preenchidas por representantes femininas, sendo 25% (vinte e cinco por cento) desses 50% (cinquenta por cento) para representantes femininas negras.”

[1] STF. ADPF 548 MC, Rel. Min. Cármem Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 20.11.2018.

[2] Fávila Ribeiro a define propaganda como “um conjunto de técnicas empregadas para sugestionar pessoas na tomada de decisão” (in Direito Eleitoral, 5ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 445). José Jairo Gomes, por sua vez, conceitua como “aquela adrede preparada para influir na vontade do eleitor, em que a mensagem é orientada à atração e conquista de votos” (in Direito Eleitoral, 16ª Ed., São Paulo: Atlas, 2020, p. 539).

[3] “Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. TSE. Respe nº 16183/MG, Rel. Min. Eduardo Alckmin, DJ 31.03.2000.

[4] TSE. Respe nº 060531076, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJe 16.11.2020.

[5] STF. Inq nº 4435 AgR-quarto, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 21.08.2019.

[6] TSE. Rp nº 586, Rel. designado Min. Fernando Neves, publicado em sessão 21/10/2002.

[7] SOARES, Michel Bertoni. Doações de Pessoas Jurídicas: financiamento eleitoral e poder econômico. Dissertação (Mestrado) – Direito Político e Econômico, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2019. Disponível em: http://tede.mackenzie.br/jspui/handle/tede/4011/statistics. Acesso em 16 abr. 2021.

[8] TJSP. AI nº 2227078-53.2020.8.26.0000, Rel. Des. Celso Pimentel, 28ª Câmara de Direito Privado, DJe 11.12.2020.

[9] STJ. Resp 1891644/DF, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 05.02.2021.

[10] TRE/SP. PC nº 0000120-55.2016.6.26.0000, Rel. Des. Waldir Nuevo Campos, DJe 22.01.2020; TRE/SP. PC nº 0000136-77.2014.6.26.0000, Rel Juiz Manuel Marcelino, DJe 11.02.2019; TSE. AgR no Respe nº 1539, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 03.05.2019.

[11] de autoria Ministério Público de São Paulo,  Vote Nelas, Grupo Mulheres do Brasil, Grupo de Estudos de Gênero e Política (GEPÔ/USP), A Fala/Visibilidade Feminina, AMT-SP, APPCívico, Elas na Política, Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE/SP), Mulher Ação, Mulheres com Direito,  Rede Feminista de Juristas (deFEMde), Mulheres Negras Decidem, Instituto Política por/de para mulheres, LideraA, Instituto de Juristas Brasileiras, Advogadas do Brasil, Visibilidade Feminina, Instituto Ecoconnecta, Coletivo Mães na Luta, Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL), Conselho Nacional do Laicato do Brasil da Região Episcopal Sé, Linhas de Sampa, Iniciativa Brasilianas, PartidA Feminista, Instituto UPDATE, Mulheres no Poder, Pastoral Fé e Política, Rede Umnuna, Movimento Coletivo Helen Keller e Observatório de Candidaturas Femininas da OABSP:

Clique aqui e confira a nota técnica na íntegra, em formato PDF.