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“Lei Maria da Penha é um divisor de águas no Brasil”, diz Patricia Vanzolini

By 7 de agosto de 2023No Comments

Durante a Jornada Cultural, presidente da OAB SP palestrou sobre a importância do julgamento do Supremo Tribunal Federal que derrubou a tese de legítima defesa da honra

A Lei Maria da Penha completa 17 anos nesta segunda-feira (7). A OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil secional São Paulo) abordou o tema na Jornada Cultural, evento gratuito que, durante toda a semana, reúne uma série de palestras e discussões sobre temas centrais da prática do Direito. 

O painel sobre o Aniversário da Lei Maria da Penha aconteceu às 11h, na sede da secional, e contou com a participação da presidente da OAB SP, Patricia Vanzolini, da diretora secretária-adjunta da OAB SP, Dione Almeida, da presidente da Comissão de Mulheres Advogadas (CMA) da OAB SP, Isabela Castro de Castro, da vice-presidente da Comissão das Mulheres Advogadas da OAB SP e conselheira secional, Ana Carolina Lourenço, da líder do grupo de trabalho de Violência Doméstica da CMA, Ana Paula Braga, e da vice-presidente da Comissão de Igualdade Racial do CFOAB, Lázara Carvalho.

A Lei Federal nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha, tornou mais rigorosa a punição para agressões contra a mulher quando ocorridas no ambiente doméstico e familiar. O nome da lei é uma homenagem a Maria da Penha Maia, que foi agredida pelo marido durante seis anos até se tornar paraplégica, depois de sofrer atentado com arma de fogo, em 1983.

Segundo Patricia Vanzolini, a data marca a festa de aniversário de uma lei que foi um divisor de águas no Brasil. “É preciso reconhecer e homenagear a coragem de uma mulher que deu nome a uma lei que mudou a vida de muitas mulheres. É uma mulher que sofreu ataques ao seu corpo físico e até hoje sofre ataques à sua moral. Isso se trata de dizer que somos gratas a ela e queremos levar essa lei cada vez mais longe e mais a fundo”, disse. 

A diretora secretária-adjunta da OAB SP, Dione Almeida, afirmou que é necessário combater a violência de gênero e de raça. “Não podemos medir esforços para combater as diversas violências. A violência doméstica impacta nas relações de trabalho e de emprego, e precisamos nos atentar para não revitimizar essas mulheres em outros espaços. Precisamos melhorar enquanto sociedade, para que um dia a gente lembre sem nenhuma saudade dos índices de violência contra a mulher no nosso país”, destacou.

A presidente da Comissão das Mulheres Advogadas, Isabela Castro de Castro, destacou que este é o primeiro evento oficial como Comissão das Mulheres Advogadas, que mudou sua nomenclatura recentemente. “Quero reforçar a importância desse tema, especialmente no momento atual, onde estamos vivendo uma epidemia de violência, são índices muito altos que precisamos combater incessantemente”, ressaltou. 

A vice-presidente da Comissão das Mulheres Advogadas, Ana Carolina Lourenço, também destacou a importância da data e reforçou que ela deve ser comemorada. “Temos que lembrar que, para além da coragem que ela [Maria da Penha] teve ao advogar por si, ela também buscou o direito de mulheres que sofrem violência doméstica. Temos que observar, enquanto sociedade, as nossas falhas e negligências que podem ser melhoradas através da educação, da consciência, da responsabilidade e do afeto”, falou.  

Em sua fala, a chefe de gabinete da Secretaria Nacional de Justiça e vice-presidente da Comissão de Igualdade Racial do CFOAB, Lázara Carvalho, abordou o aspecto sociológico da violência contra a mulher por meio de uma análise da canção Exagerado, de Cazuza. “Nós naturalizamos as coisas através das mensagens que recebemos, da arte, de coisas que nos emocionam. Essa canção fala sobre algo que é o vetor da violência contra as mulheres: a ideia de que somos coisas que pertencem a alguém. O controle exercido sobre os corpos femininos tem um objetivo claro: o impedimento da paridade de gênero. Amores inventados são amores que matam. Quem é exagerado no amar também é exagerado no odiar”, alertou.

Lázara Carvalho também reforçou a necessidade de que os profissionais da advocacia ampliem sua consciência sobre os direitos da mulher. “A Justiça é uma das portas mais importantes para mulheres que saem do ciclo de violência. É imperativo que nós, juristas, tenhamos noção da nossa responsabilidade. É um tema que diz respeito a todos nós, em todos os nossos processos, independente da área de atuação. Não existe empoderamento sem a liberdade dos corpos femininos.”

Ana Paula Braga, líder do grupo de trabalho de Violência Doméstica da CMA, fechou a discussão trazendo uma reflexão acerca da importância da Lei Maria da Penha. “Eu gosto sempre de lembrar que a Lei Maria da Penha não foi um presente, foi fruto de muita luta dos movimentos de mulheres. Antes disso, o Brasil sistematicamente negava os direitos de todas as mulheres ao não ter os instrumentos adequados para combater o problema da violência. É uma lei que vai muito além do aspecto criminal, ela é multidisciplinar”, contou.

A especialista ainda fez um apelo para que, cada vez mais, operadores do direito possam contribuir para uma melhor efetividade da Lei. “Ainda são poucos que conhecem a lei, que já leram a lei na íntegra. A Lei Maria da Penha não entra no conteúdo obrigatório dos currículos das faculdades, por isso muitos advogados e advogadas não sabem aplicá-la. A violência contra a mulher se combate a muitas mãos, em muitas instâncias e, nós, advogados, somos uma peça muito importante nessa engrenagem”, finalizou.

Legítima defesa da honra

Patricia Vanzolini, em sua palestra, falou sobre um dos julgamentos mais importantes de 2023, a ADPF 779, que discutia a validade da tese da legítima defesa da honra. Na semana passada, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu, de maneira unânime, o uso desta tese nos crimes de feminicídio. A presidente da entidade contou a origem da tese e também como ela surgiu no contexto nacional. 

“Até 2005, o Código Penal brasileiro previa o adultério como crime. Mas houve um caso que foi divisor de águas, o da Angela Diniz e do Doca Street. Ele foi a virada de chave na ideia da legítima defesa da honra. Na ocasião, Doca Street matou Angela e foi condenado a dois anos de detenção, porque a defesa alegou legítima defesa da honra. A sentença condenatória equivaleu a uma absolvição. O caso gerou intensa comoção pública e uma intensificação do movimento feminista. Com isso, Doca foi submetido a um segundo julgamento, sendo condenado a 15 anos de reclusão”, contou.

Desde então, ela apontou que a tese da legítima defesa da honra foi utilizada em tribunais com uma roupagem mais moderna. “Essa ideia de que a conduta sexual de uma mulher dá permissão para que um homem possa matá-la continua acontecendo. Por isso, estou plenamente de acordo com o julgamento definitivo do Ministro Toffoli. Quando a liminar foi referendada, houve questionamentos de que ela cerceava o direito à plenitude de defesa. Mas eu acredito que a plenitude de defesa não alberga discurso de ódio. Que justiça é essa que se serve de um argumento inconstitucional para ser feita? Se o advogado se utilizar desse argumento no tribunal do júri, o júri será anulado”.

A presidente recomendou aos advogados criminalistas presentes na palestra cuidado ao construir argumentações com a tese, alegando que a aplicação prática deve ser eficaz. “Como cidadãos,  a nossa preocupação é como evitar o feminicídio. Enquanto advogados, não podemos defender feminicídio usando um recurso argumentativo de ódio, que estimula feminicídio. Nós, advogados, temos que atuar profissionalmente, mas também com ética e responsabilidade”, finalizou.

A Jornada Cultural conta com o apoio institucional da CAASP (Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo) e da OABPrev-SP. O evento é gratuito. As vagas são limitadas e as inscrições podem ser realizadas pelo site da Sympla. Todos os presentes serão conferidos com certificados de participação e concorrerão a um par de ingressos para o Baile da Advocacia, uma noite de festa promovida pela OAB SP no próximo dia 19 de agosto em comemoração ao Mês da Advocacia.

Serviço:

Jornada Cultural

De 07 a 11 de agosto de 2023, das 9h às 18h

Endereço: Sede OAB SP – Rua Maria Paula, 35, Bela Vista, SP

Programação completa disponível em https://sites.google.com/oabsp.org.br/jornadacultural