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Desigualdade de gênero e violência: no primeiro semestre de 2023, Brasil registrou 722 feminicídios

By 14 de novembro de 2023novembro 17th, 2023No Comments
Isabela de Castro

Dado alarmante é o maior registrado nos últimos quatro anos e foi tema de debate durante a CRADV23; Julgamento e Perspectiva de Raça também foram abordados no evento

No último dia da 14ª Conferência Regional da Advocacia (CRADV23), promovida pela OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo) nesta terça-feira (14), o tema diversidade foi destaque entre especialistas no assunto.  Advogados falaram dos desafios e disparidades que esse ecossistema de minorias enfrenta. 

Isabela de Castro, presidente da Comissão da Mulher Advogada, usou dados alarmantes de violência contra as mulheres para demonstrar a importância da igualdade de gênero. 

Neste ano, até o mês de julho foram registradas 722 mortes de mulheres por violência no Brasil, segundo relatório divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Esse é o maior número de feminicídios desde 2019.

“Dados como esse apontam para uma epidemia, e a violência contra a mulher é diretamente proporcional à desigualdade de gênero. Por isso, essa é uma questão que remete a todos nós”, pontua a advogada.  

Segundo ela, as mulheres precisam estar mais presentes no mercado de trabalho e na política. Sem isso, a cultura mundial sobre o tema não vai mudar.

“Um relatório das Nações Unidas pontua que 46% da população global acha que o homem tem mais direito ao emprego do que a mulher, e para 25%, é aceitável que o marido aplique castigos físicos à mulher”, relata a presidente da Comissão. “A situação piora porque as mulheres não confiam no sistema para denunciar, e isso precisa mudar”, completa.

Leia também: OAB SP prestará assistência jurídica às mulheres vítimas de violência de gênero

Já Adriana Galvão, presidente da CAASP e especialista em diversidade, começou a sua palestra com uma foto da composição do Tribunal de Justiça de São Paulo para demonstrar o quanto esses espaços são dominados por homens e brancos. 

Adriana Galvão

Adriana Galvão

“Em São Paulo, há apenas 18 negros entre os mais de 2.500 juízes, e são 37 mulheres entre os mais de 360 desembargadores”, pontuou Galvão. 

Para mudar esse cenário e tornar os espaços de Direito e Justiça mais inclusivos, é preciso aplicar novas práticas, como a equidade, agora considerada para o Quinto Constitucional. “Essa preocupação deve estar nas empresas também. Quando se fala de ESG, é preciso pensar nessas relações sociais”, diz a advogada. 

Definir cotas raciais e de gênero não é suficiente, se não houver um ambiente inclusivo e responsável dentro das companhias. “Mulheres negras têm mais dificuldade de chegar a um cargo de chefia, por exemplo. Como diz uma executiva da Netflix ‘diversidade é convidar para a festa, e inclusão é chamar para dançar”, conta Galvão, se referindo a Vernā Myers, vice-presidente de estratégia de inclusão do streaming. 

Para combater de fato a discriminação, a empresa precisa ter firme o discurso de que atos como esse são ilegais e não serão tolerados. Além disso, informar as consequências dessa violação. “Os funcionários necessitam, ainda, da garantia de sigilo ao denunciar, e o afetado também deve contar com o apoio da empresa”, lembra a advogada.

Leia também: Comissão de Igualdade Racial da OAB SP debate dificuldades estruturais para a advocacia negra

Julgamento e Perspectiva de Raça, com Irapuã Santana

Ainda sobre diversidade, o presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB SP, Irapuã Santana, palestrou sobre o “Julgamento e Perspectiva de Raça”. 

O advogado apresentou conceitos de psicologia social e neurociência e mostrou um estudo apontando que, quanto mais negra é uma pessoa, maior é sua possibilidade de receber a sentença de morte. “Se for um acusado preto com uma vítima branca, aumenta de 20% a 30% a possibilidade de receber essa sentença”, acrescentou.

“Quando falamos de neurociência, tudo se resume a isso. Alguém inventou que negros são inferiores, essa ideia pegou e está embutida no nosso cérebro”, afirma Santana. O advogado conta que a psicologia já definiu o racismo como um estresse pós-traumático contínuo, por conta de todas as opressões vividas diariamente. “O resultado do racismo é o estrago da autoestima de pessoas pretas ao ponto que elas acreditem que não têm o direito de sonhar”, concluiu Santana.

Cidadania LGBTI+ e a Constituição Federal

A presidente da Comissão Permanente de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB SP, Heloisa Alves, tratou da “Cidadania de LGBTI+ e a Constituição Federal”. Segundo a advogada, há avanços na luta pela diversidade, porém ainda existe um déficit inconcebível em todos os âmbitos do Poder Legislativo.

O país teve 273 mortes violentas de pessoas LGBTI+ só no ano passado. “Nós temos visto aqui no Brasil o Congresso Nacional não legislar em prol à garantia dos direitos da população LGBTI+”, criticou, citando o PL 5.167 de 2009, que proíbe casamentos homoafetivos e que voltou à pauta da Câmara recentemente. 

“A justificativa deles é de chorar. Ler aquilo e saber que são ações de parlamentares, pessoas que deveriam estar legislando em prol do direito de todas as pessoas”, diz Alves. 

O projeto de lei foi aprovado na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescente e Família na Câmara dos Deputados, no mês passado. “Havia uma maioria de parlamentares de extrema-direita e da bancada religiosa, que aprovaram o parecer. Agora, foi para a Comissão de Direitos Humanos, onde a gente espera que seja arquivado porque o texto é inconstitucional”, defende. 

Alves convidou a advocacia a refletir sobre esses casos para mudar a visão da sociedade.  “São vários projetos que refletem o atual animus do nosso Poder Legislativo. Vocês, operadores do Direito, estejam do nosso lado para não permitir esse retrocesso”, finaliza a presidente da Comissão.

14ª Conferência Regional da Advocacia (CRADV23)

A 14ª Conferência Regional da Advocacia (CRADV23) acontece em São Paulo nos dias 13 e 14 de novembro. Durante todo o ano de 2023, o evento percorreu diversas cidades do estado paulista, reunindo quase 9 mil advogadas e advogados em debates atuais e relevantes sobre as tendências do mercado jurídico e assuntos de interesse da classe. 

A CRADV23 é promovida pelo Universo OAB SP – formado pela Ordem paulista, suas subseções, Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (CAASP), Escola Superior da Advocacia (ESA) e OABPrev-SP – e tem como objetivo, além da capacitação, a confraternização e o fortalecimento da advocacia. Grandes nomes do direito brasileiro participaram das edições anteriores e, para esta última edição, o Universo OAB SP preparou uma Conferência em formato especial, com dois dias de evento e várias aulas magnas.

No primeiro dia da Conferência, 13 de novembro, as atividades foram concentradas na sede da OAB SP (Rua Maria Paula, 35 – Bela Vista). A partir das 16h, foram oferecidas quatro “Trilhas de Aprendizagem”, focadas no público das Comissões: Igualdade Racial, Prerrogativas, Assistência Judiciária e Colégio Regional de Presidentes – as duas últimas fechadas ao público.

O dia 14 de novembro contará com uma extensa programação no Teatro Liberdade (Rua São Joaquim,129 – Liberdade). Ao longo do dia, serão oferecidas mais de 20 palestras com profissionais renomados do mercado jurídico e conteúdo de alta qualidade.