Painel com especialistas aconteceu durante a Fenalaw 2023, maior evento para o mercado jurídico da América Latina
Uma área de Compliance bem estruturada desempenha papel importante para o sucesso de uma empresa, além de atuar na proteção dos direitos e da dignidade de seus colaboradores. Neste sentido, a figura do advogado é fundamental.
A Fenalaw 2023, maior evento para o mercado jurídico da América Latina, dedicou um dia inteiro de programação de um de seus auditórios para a apresentação de palestras ligadas ao tema. Entre estas, o painel Como Estruturar o Canal de Denúncias para Lei de Assédio no Ambiente de Trabalho para Proteção de Mulheres, ministrado pela advogada especialista em políticas antidiscriminatórias Luana Pereira da Costa, pela advogada e gerente de compliance da Unicred, Aline Damasio Goulart, e pela presidente da Comissão Multidisciplinar da Associação Brasileira de Advogados (ABA) Niterói/RJ, Viviane Pires.
As profissionais mencionaram a lei nº 14.457/2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres. “O texto da lei traz a obrigatoriedade de tratar os temas de violência, assédio sexual e outras formas de discriminação de denúncias contra a mulher no ambiente de trabalho, além da obrigação de se criar um canal para o acolhimento das denúncias”, explicou Luana.
Ela opinou que, para estruturar um canal de denúncias de forma eficaz, o primeiro ponto que deve ser endereçado é a conscientização e a desnaturalização de condutas assediadoras.
“Infelizmente, em alguns ambientes existem condutas que são naturalizadas. Precisamos trazer essa conscientização para que as mulheres não apenas saibam identificar em si a ocorrência de violência, como em outras colegas”.
Além disso, a advogada disse que, durante a apuração da denúncia, a área de compliance deve evitar ao máximo qualquer tipo de viés que culpabilize a vítima. “Temos que compreender e acolher. A não revitimização também é importante, devemos tomar cuidado para a vítima de violência não ter que reviver aquela dor relatando a situação várias vezes. A pessoa que está fazendo a denúncia de violência está em situação de vulnerabilidade, ela precisa ser acolhida e não inquirida”, concluiu.
Em sua fala, Aline Damasio Goulart trouxe dados para reforçar a importância de se debater o tema. “Em 2021, o Tribunal Superior do Trabalho apontou mais de 52 mil casos de assédio moral. A gente tem um número que nos faz refletir bastante e, obviamente, quando falamos de interseccionalidade, sabemos que as que mais sofrem assédio são as mulheres pretas. É um problema de gênero, raça e classe social.”
A gerente de compliance apresentou alguns passos adotados por sua empresa para a implementação efetiva de um canal de violência contra as mulheres. “O primeiro é a sensibilização. Nós iniciamos um trabalho de sensibilização com um programa de diversidade e inclusão que tinha a frente de gênero como uma das prioritárias. É preciso preparar o público para ouvir falar de assédio moral e sexual. O segundo ponto é a criação de um canal de denúncias externo, que dá mais segurança ao denunciante de que o IP não seja identificado, que funcione 24 horas por dia em todos os dias da semana e etc. No nosso caso, o canal prevê o atendimento feito exclusivamente por mulheres psicólogas.”
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Aline também citou a necessidade de criação de uma política de consequências. “Os números mostram que, muitas vezes, as mulheres não denunciam pois têm certeza da impunidade de quem cometeu o fato. E, por fim, o outro passo importante é ter um processo de investigação corporativa robusto. Além de ter, dentro da instituição, uma investigação com profissionais qualificados, nós recomendamos que um escritório terceirizado faça a apuração e as entrevistas. Isso porque, muitas vezes, a mulher se sente envergonhada de relatar o assunto para um colega de trabalho”.
Presidente da Comissão Multidisciplinar da ABA Niterói/RJ, Viviane Pires concordou com a colega de painel. “É muito comum que as entrevistas sejam feitas pelo RH, mas o constrangimento que isso gera é muito grande. Ter o parecer isento de um escritório vai fazer muita diferença”.
A advogada destacou que a área de compliance e, em especial, a implementação de um canal de denúncias, abarca um nicho de atuação crescente e relevante para a advocacia.
“Uma pesquisa da KPMG mostra que 95% das empresas já possuem um canal de denúncias e o motivo que as leva a isso é ter um compliance estruturado. Este é um trabalho em que os advogados podem agregar muito. Temos que ter o relato da denúncia registrado por escrito, dar a oportunidade de o denunciado se defender, enfim… Essa é uma visão que só o advogado traz.”
Por fim, Viviane ressaltou que é importante alinhar expectativas com a denunciante em relação ao tempo de apuração. “Se a gente, quando se depara com algum imprevisto pequeno em nosso dia a dia, já quer uma resolução imediata, o que dirá de quem procura um canal de denúncias. Imagine o nível de aflição desta pessoa. A melhor forma de não perder a confiança de quem denunciou é alinhar o tempo médio de apuração.”
“Essa confiança se conquista com o tempo, com diálogo e com treinamentos. Quando você oferece treinamento para explicar o funcionamento do fluxo das denúncias, elas entendem. Ao fim e a cabo, a responsabilidade do compliance é não permitir que aquela situação de assédio ou violência continue, independente do que será feito ao denunciado”, concluiu.
A Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB SP) participa da Fenalaw 2023 com um estande de vendas que reúne todas as vantagens do Universo OAB SP – composto pela Ordem paulista e suas subseções, Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (CAASP), Escola Superior da Advocacia (ESA) e OABPrev-SP.
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O principal evento jurídico da América Latina acontece entre os dias 25 e 27 de outubro no Centro de Convenções Frei Caneca, na capital paulista, reunindo profissionais, estudantes e empresas do setor, com o intuito de discutir tendências, inovações e tecnologia no exercício jurídico.
Advocacia sem Assédio na OAB SP
Desde 2022, a OAB SP oferece o canal Advocacia sem Assédio, para que as advogadas paulistas possam fazer as denúncias de maneira segura, com privacidade, e para que os casos sejam apurados com extremo rigor.
Para a estruturação do projeto no Estado, a Ordem contou com o auxílio da Deloitte, que construiu um canal de denúncias dentro de um ambiente de máxima segurança. “Tivemos a preocupação de ter uma empresa com credibilidade, para a construção de um sistema que tenha total proteção. As mulheres precisam acreditar nessa infraestrutura para de fato denunciarem”, afirmou Patricia Vanzolini, presidente da OAB SP.
O programa Advocacia sem Assédio da OAB SP conta ainda as parceiras: o projeto Justiceiras, que oferece orientação jurídica, psicológica, médica, rede de apoio e acolhimento gratuita e on-line a vítimas de violência doméstica, e o movimento Me Too Brasil, que ajuda vítimas de violência sexual a romperem o silêncio. “Buscamos projetos que tenham a expertise no tratamento das denúncias de violência doméstica, no acolhimento da mulher, na escuta, para que a pessoa que está denunciando seja absolutamente respeitada. É algo muito sensível, importante, de responsabilidade, por isso tomamos todos esses cuidados. Estamos dando um passo concreto, um avanço que veio para ficar”, destacou Patricia.
Para fazer uma denúncia, acesse o site: https://advsemassedio.org.br/