Por meio de sua Comissão de Direitos Humanos e seu Núcleo de Direitos Indígenas e Quilombolas, Secional também está preocupada com a possível transferência da competência para a condução dos processos de demarcação de terras indígenas, objeto da MP 1154/2023
A Ordem dos Advogados do Brasil seção de São Paulo (OAB SP), por meio de sua Comissão de Direitos Humanos e seu Núcleo de Direitos Indígenas e Quilombolas, vem a público externar sua preocupação em relação às recentes medidas adotadas no âmbito do Congresso Nacional, em especial a aprovação de regime de urgência para votação do Projeto de Lei (PL) 490/2007, que visa instituir o marco temporal por meio de lei, bem como a transferência da competência para a condução dos processos de demarcação de terras indígenas, objeto da Medida Provisória (MP) 1154/2023, do Ministério dos Povos Indígenas para o Ministério da Justiça e Segurança Pública.
A proposição do marco temporal, criada por setores contrários à demarcação das terras indígenas, sob todos os pontos de vista a serem considerados (histórico, sociológico, antropológico, político e jurídico), constitui violação das normas vigentes no Brasil, bem como das normas internacionais. Na verdade, ela representa a consolidação de séculos de extermínio e espoliação contra os povos indígenas do Brasil.
O marco temporal é assim denominado pois impõe a cada povo indígena – para que tenha reconhecida e demarcada sua terra ancestral e tradicional – o ônus da prova de que, em 5 de outubro de 1988, ocupavam referidas terras de modo produtivo ou, ainda, que demonstrem que na citada data estavam litigando em juízo pela mencionada terra indígena. O reconhecimento do direito à posse permanente sobre as terras indígenas apenas a partir de 5 de outubro de 1988 impõe grave ameaça existencial às culturas originárias do Brasil.
A Constituição Federativa do Brasil de 1988 é taxativa quanto à posse permanente das terras indígenas enquanto direito fundamental das culturas originárias do país. Pertencem à União e sua posse permanente cabe a cada cultura indígena em relação às suas respectivas terras.
A consequência advinda a partir de uma eventual aprovação do marco temporal se dará diretamente sobre a própria existência das culturas indígenas, que encontram em suas terras tradicionais uma extensão de seus corpos, suas culturas, crenças e modos de vida.
A OAB SP, por meio de sua Comissão de Direitos Humanos e de seu Núcleo de Direitos Indígenas e Quilombolas, prosseguirá acompanhando o trâmite das mencionadas medidas legislativas sob o crivo de sua constitucionalidade e convencionalidade, parâmetros essenciais para a preservação dos direitos fundamentais e do regime democrático.
Patricia Vanzolini
Presidente da OAB SP
Leonardo Sica
Vice-presidente da OAB SP
Priscila Beltrame
Vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB SP
Flávio de Leão Bastos Pereira
Coordenador dos Núcleos da Memória e de Direitos Indígenas e Quilombolas