Proposta foi sustentada pela conselheira federal por São Paulo, Silvia Souza, em sessão do Conselho Pleno da OAB
A conselheira federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) por São Paulo e presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Silvia Souza defendeu, em reunião no dia 28 de setembro, a obrigatoriedade da criação de bancas de heteroidentificação – como é chamada a identificação de uma pessoa feita por outra, em oposição à autodeclaração – para atuar no controle de possíveis fraudes referentes às cotas raciais na composição das chapas nas eleições da Ordem.
Souza defendeu as bancas durante sessão virtual extraordinária do Conselho Pleno da entidade. Na reunião, ela destacou que o provimento que regulamenta as eleições da OAB passa por uma revisão visando os próximos pleitos, e, em seguida, lembrou que a OAB tem uma política de ações afirmativas para a participação de pessoas negras nas formações das chapas desde a última eleição da Ordem, em 2021, instituída por meio da Resolução nº 5 de 2020.
Entre as alterações promovidas no Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB à ocasião, a resolução determinou que ao menos 30% das chapas sejam compostas por advogados negros e advogadas negras nas eleições para as diretorias do Conselho Federal, dos Conselhos Secionais e Subseções e das Caixas de Assistência dos Advogados.
A banca de heteroidentificação irá avaliar os candidatos das chapas que se autodeclararem pretos ou pardos usando critérios fenotípicos. “Nesta sessão do Conselho, nós, da bancada de São Paulo, tivemos a oportunidade de defender e sustentar a importância das bancas de heteroidentificação para a efetivação das políticas de cotas raciais na composição das chapas”, relatou Silvia Souza, primeira mulher a presidir a CNDH da OAB.
“A banca é indispensável para que as políticas de ações afirmativas não deixem de atender às finalidades que justificam a sua existência, ou seja, para que a promoção da igualdade racial possa ser efetivamente alcançada”, completou.
Com uma história de luta pela democracia e pela equidade racial, a OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo) já possui desde 2022 uma Comissão de Heteroidentificação, no âmbito da Comissão do Quinto Constitucional.
A comissão tem o objetivo de avaliar o fenótipo de candidatos(as) pretos(as) e pardos(as) que pretendem compor as listas sêxtuplas do Quinto Constitucional.
As propostas de alterações nas normas eleitorais vigentes na OAB apresentadas na sessão foram encaminhadas para a Comissão Eleitoral e para a presidência do Conselho Pleno da entidade.
Além da presidente do CNDH, a proposição está assinada por conselheiras federais de outros estados – Silvana Niemczewski (PR), Suena Carvalho Mourão (PA) e Silvia Nascimento Cardoso dos Santos Cerqueira (BA) – e por toda a bancada da OAB SP no Conselho – conselheiras federais Alessandra Benedito e Daniela Campos Libório, e conselheiros federais Carlos José Santos da Silva, Hélio Rubens Costa e Alberto Zacarias Toron.
“O nosso documento tem o objetivo de oferecer diretrizes ao provimento, como, por exemplo, a banca de heteroidentificação ser um órgão da Comissão Eleitoral, devendo ser criada pelo presidente da secional. O procedimento de heteroidentificação tem caráter complementar à autodeclaração, baseado na percepção social de terceiros sobre a autoidentificação étnico-racial”, revelou.
“Outra sugestão é sobre a composição da banca. O ideal é que ela seja em número ímpar de membros e que seja heterogênea, com pessoas de diversas etnias. A gente sugere também que haja participação de pessoas do movimento negro, professores, pesquisadores e pessoas que tenham afinidade com os estudos da questão racial no Brasil”, acrescentou a conselheira.
A sessão extraordinária do Conselho Pleno foi presidida pelo vice-presidente da OAB Nacional, Rafael Horn, que reforçou que as propostas serão analisadas. “Vamos trazer este debate para reflexão por parte da Comissão Eleitoral”, informou Horn.
Histórico de lutas
Em sua sustentação na sessão extraordinária do Conselho Pleno, a conselheira Silvia Souza também relembrou atuações históricas da Ordem na defesa da implementação das ações afirmativas de cotas raciais no Brasil.
Ela citou, Inicialmente, a participação de destaque da OAB como amicus curiae na discussão da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, que declarou constitucionais as cotas raciais no ensino superior público federal. Neste caso, a sustentação oral no Supremo Tribunal Federal (STF) foi realizada pela primeira conselheira federal negra da OAB, Sílvia Cerqueira.
Outro momento emblemático recordado foi a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 41, ajuizada pela Ordem e que declarou a constitucionalidade das cotas nos concursos públicos. “A OAB teve um papel primordial na discussão da ADPF 186 e foi autora na ADC 41. Então é importante que dentro da nossa casa a gente também adote esta política que nós defendemos no Judiciário”, reforçou.
Durante a sessão, a conselheira federal também fez questão de salientar o ofício encaminhado pela Associação Nacional da Advocacia Negra (ANAN) à presidência do Conselho Federal da OAB, defendendo a implementação das comissões de heteroidentificação e expressando sua profunda preocupação quanto à possibilidade de uma possível revisão na Resolução nº 5 de 2020, que estabeleceu mudanças históricas para a Ordem no que se refere à paridade de gênero e política de cotas raciais nas eleições da entidade.
No documento, a ANAN, que congrega mais de 15 mil advogadas e advogados negros, solicita que o “Conselho Federal da OAB reafirme seu compromisso com a Resolução 5/20 e trabalhe incansavelmente para garantir que as políticas de paridade de gênero e cotas raciais sejam aplicadas e mantidas nas próximas eleições da OAB em todas as suas instâncias, incluindo o Conselho Federal, seccionais, subseções e Caixas de Assistência.”