Solano de Camargo, presidente da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB SP, fala sobre mercado em expansão e uso da tecnologia de forma estratégica
A digitalização da humanidade, as mudanças de comportamento impostas pela pandemia da Covid-19, a nova economia compartilhada, as redes sociais, a implantação da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais). Esta soma de fatores fez explodir um novo mercado para a advocacia brasileira, como afirma Solano de Camargo, presidente da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo).
O advogado especialista em Direito Digital aponta que o aumento “dos crimes cibernéticos, dos golpes online, da engenharia social e dos discursos de ódio criou um sem-número de novas oportunidades para os advogados, que perpassam todas as áreas jurídicas”.
O conhecimento das novas tecnologias e das novas relações humanas no mundo digital é fundamental para captação de clientes e pode ser decisivo para a sobrevivência no mercado nos dias atuais. Camargo destaca que usar a tecnologia de forma estratégica é um diferencial para os escritórios de advocacia, mas é preciso integrar as novas ferramentas de maneira eficaz à rotina, para que agreguem valor ao serviço prestado.
Uma das ferramentas tecnológicas mais recentes é a inteligência artificial, que ainda provoca muitos questionamentos no mundo jurídico.
“A IA é, sem dúvida, uma aliada superpoderosa na advocacia, principalmente a nova IA Generativa, auxiliando na análise de grandes volumes de dados, previsão de resultados judiciais, redação de documentos, planos de trabalho, estratégias, etc. No entanto, é importante entender suas limitações”, reforça Solano de Camargo.
O advogado ressaltou ainda o trabalho da Comissão na evolução tecnológica da OAB SP e no esforço para adequação da LGPD em todo Universo OAB SP – composto pela Ordem paulista, suas subseções, Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (CAASP), Escola Superior da Advocacia (ESA) e OABPrev-SP –, o que tem ajudado a criar uma cultura de privacidade na instituição.
Confira a entrevista com Solano de Camargo na íntegra:
A Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial também trabalha para incentivar a inovação, a pesquisa e o acompanhamento jurídico das novas tecnologias. Que avanços já foram conquistados por essa rede de aprendizado?
Solano de Camargo: Nossa Comissão tem como objetivo não apenas acompanhar, mas ser proativa na evolução tecnológica, garantindo que as mudanças aconteçam de forma justa e protegida, em favor da advocacia e de toda a sociedade. Dentre os avanços alcançados nestes quase dois anos de atuação, nós organizamos cerca de 20 eventos de grande porte, como congressos, seminários e workshops, sendo que somente em novembro teremos em nossa sede o 1º Congresso de DPOs [Data Protection Officer, ou “encarregado de proteção de dados”] da OAB SP, com mais de 600 inscritos; o seminário “Apostando no futuro: o novo horizonte das apostas online no Brasil” e “3º Seminário de LGPD na Saúde Digital”.
Selecionamos 50 integrantes super qualificados da nossa comissão, que estão implementando todas as medidas de adequação da LGPD do Universo OAB SP, num esforço gigantesco. Também criamos uma rede de proteção de dados em todo o Estado, através de normativas, notas técnicas e o envolvimento de todas as subseções, com a nomeação de centenas de DPOs setoriais, o que vai criando uma cultura de privacidade em todo o universo OAB SP.
Isso tudo, sem contar o apoio à diretoria da OAB SP, com a resposta a mais de 120 consultas, formuladas pelas subseções e outras comissões. Também conseguimos emplacar a primeira pós-graduação desta nova gestão da ESA, que é o Curso de Especialização em Proteção de Dados e Formação de DPOs e, não menos importante, celebramos convênios com 90% dos tribunais paulistas, regulamentando a solicitação, o envio e o tratamento de dados de advogados e advogadas por parte do Poder Judiciário.
Além disso, implementamos o Marketplace de Lawtechs, o maior ecossistema de inovação jurídica do Brasil, já contando com quase 100 startups jurídicas à disposição de todos os profissionais da área jurídica não só de São Paulo, mas também do Brasil.
Falar de privacidade não é algo novo, mas o assunto ganhou novas dimensões com a explosão das redes sociais. Como a advocacia pode aproveitar este mercado, principalmente com o advento da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados)?
Solano de Camargo: A digitalização da humanidade, reforçada pela pandemia e acelerada pela nova economia compartilhada e o advento das redes sociais, somadas com a implementação da LGPD, trouxeram uma demanda crescente de clientes que precisam de orientação quanto à conformidade e proteção de dados.
Além disso, a explosão dos crimes cibernéticos, dos golpes online, da engenharia social e dos discursos de ódio, criou um sem-número de novas oportunidades para os advogados, que perpassam todas as áreas jurídicas, como o direito do trabalho, direito criminal, direito de família ou direito empresarial.
Advogados podem se especializar em direito digital e de privacidade, disponibilizando consultoria para empresas que buscam se adaptar às normas da LGPD e, ao mesmo tempo, entender como a legislação se aplica às inovações tecnológicas em todas as áreas do direito, principalmente as contenciosas.
Por essa razão que nossa Comissão possui uma liderança baseada em coordenadorias, ocupadas por advogadas e advogados oriundos dos departamentos jurídicos das big techs, de grandes empresas e instituições financeiras, assim como professores das mais renomadas universidades do Estado e sócios de escritórios de advocacia especializados na matéria, visando compartilhar o conhecimento com todos os integrantes de nossa comissão.
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A segurança de dados também deve ser uma preocupação dos escritórios de advocacia, uma vez que lidam com muitas informações sensíveis. Quais ferramentas advogados e advogadas podem e devem usar para evitar vazamento de dados?
Solano de Camargo: A segurança de dados é primordial. Como temos reforçado em nossos eventos e em nossas reuniões mensais, as advogadas e advogados devem investir em sistemas de gestão com criptografia robusta, treinar suas equipes quanto à importância da segurança da informação, utilizar autenticação de dois fatores para acesso a dados sensíveis e, sempre que possível, contratar especialistas ou empresas de segurança da informação para avaliar e melhorar seus sistemas. Além disso, é importante desenvolver protocolos de segurança, inclusive, visando atuar em casos de incidentes ou ataques hacker, protegendo seu escritório e as informações confiadas aos clientes.
Aliás, um crime cada vez mais frequente é justamente o sequestro de dados de empresas e instituições feito por hackers – na maior parte, estrangeiros – que pedem pagamentos em criptomoedas. Como a advocacia deve tratar esses casos? Qual o amparo da legislação brasileira para ataques hackers?
Solano de Camargo: O sequestro de dados, também conhecido como ransomware, é um crime sério e infelizmente cada vez mais comum. Os profissionais da área jurídica devem desenvolver estratégias preventivas e sempre orientar seus clientes na condução dessas ocorrências, elaborando os documentos regulatórios, se necessário, assim como conduzir os procedimentos junto à autoridade policial.
Também é importante que as advogadas e advogados acompanhem a contratação das companhias seguradoras, cuja cobertura tem se mostrado essencial às vítimas na ocasião dos ataques. A legislação brasileira, por meio do Marco Civil da Internet e do Código Penal, oferece amparo contra os ciberataques, além de todas as normas relacionadas à indenização.
Quais as dicas para o advogado ou advogada que está pensando em usar a inteligência artificial em seu trabalho? Por onde começar? Que riscos devem ser evitados?
Solano de Camargo: A IA é sem dúvida uma aliada superpoderosa na advocacia, principalmente a nova IA Generativa, auxiliando na análise de grandes volumes de dados, previsão de resultados judiciais, redação de documentos, planos de trabalho, estratégias, etc. No entanto, é importante entender suas limitações.
O advogado deve começar com cursos de capacitação, escolher ferramentas de IA já testadas no mercado jurídico e estar sempre atento para não depender totalmente da tecnologia, usando seu julgamento e expertise humana. A IA Generativa tem o potencial de democratizar ainda mais o conhecimento e o trabalho das advogadas e advogados, aumentando exponencialmente a qualidade dos trabalhos e a produtividade.
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A inovação jurídica não passa somente pela inteligência artificial, mas também pelo uso de ferramentas tecnológicas para a advocacia – a exemplo das dezenas de ferramentas disponíveis no Marketplace de Lawtechs da OAB SP. Como tornar esses softwares e aplicativos um diferencial no trabalho jurídico?
Solano de Camargo: A inovação jurídica vai além de ferramentas e aplicativos. Para torná-los um diferencial, os profissionais devem integrá-los de maneira eficaz à sua rotina, garantindo que agreguem valor ao serviço prestado. É essencial também investir em treinamento e capacitação, garantindo que toda a equipe saiba como utilizar essas ferramentas da melhor maneira.
O diferencial não está apenas em ter a tecnologia, mas em saber usá-la de forma estratégica. Para isso, é importante às advogadas e advogados saberem quais são as categorias tecnológicas existentes para, a seguir, verificar quais as opções que melhor lhe sirvam.
Aí entra em cena o Marketplace de Lawtechs da OAB SP, que organiza todas as melhores opções tecnológicas existentes no mercado, a um custo mais baixo, em uma linguagem simples e ao mesmo tempo completa. A ideia é que todos os escritórios do Estado tenham à sua disposição, em uma plataforma simples e amigável, as melhores novidades tecnológicas disponíveis, no maior projeto de transformação digital da advocacia no Brasil.