“Corpos e Vozes: Mulheres sem Fronteiras”. Não poderia ser mais adequado o mote temático da Conferência Estadual da Mulher Advogada, realizada pela Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB SP), com organização de sua Comissão da Mulher Advogada, no último dia 19. Não há fronteiras que limitem a luta das mulheres pela ocupação dos espaços a que têm direito, pelo fim do histórico subjugo machista, da discriminação no mercado de trabalho, da imagem secular de responsáveis exclusivamente por tarefas do lar, da violência doméstica contra elas – assim deixaram claro as lideranças da advocacia e as centenas de mulheres que lotaram o auditório do Museu da Inclusão, no Memorial da América Latina.
- Veja mais fotos aqui.
A cerimônia de abertura do megaevento antecipou, em parte, o que a programação reservou para um dia inteiro. A primeira mulher a presidir a OAB SP, Patricia Vanzolini, fez o pronunciamento inicial: “Nossa luta é coletiva. São mais de mil anos de opressão, em que fomos levadas a acreditar que não poderíamos estar onde estamos. Sobrevivemos a muita coisa ao longo da história – isso já revela a nossa força”.
Amor, empatia, colaboração e força. Quatro palavras que resumem o olhar que o Universo OAB SP lança hoje sobre as mulheres advogadas, nas palavras de Patricia, para quem as ações em defesa da mulher não caminhem sozinhas: “Não existe luta antimachista que não seja, também, antirracista e anti-homofóbica. Toda exclusão é odiosa. Precisamos de diversidade não como uma concessão, mas como uma riqueza”.
A primeira mulher a presidir a Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo (CAASP), Adriana Galvão, falou em seguida. Segundo Adriana, a entidade por ela gerida – ao lado de uma diretoria composta por outras quatro mulheres e quatro homens – “está preparada para acolher a todas e todos, mas, principalmente, a mulher em condição de vulnerabilidade”.
O acolhimento citado pela presidente da CAASP mostra-se em várias frentes de atuação da Caixa de Assistência, especialmente no socorro pecuniário a advogadas que, vítimas de violência doméstica, não têm condições emocionais de exercer a profissão. “É muito triste constatar: recebemos muitos pedidos de auxílio desse tipo”, notou Adriana.
“Hoje é um dia simbólico da nossa luta por respeito e dignidade. É uma demonstração da nossa força, da força da mulher advogada no Brasil”, sentenciou a dirigente da CAASP.
Adriana lembrou ter sido durante a gestão de Marcos da Costa à frente da OAB SP, quando ela presidia a Comissão de Diversidade Sexual da Secional, que foi levada para chancela do Conselho Federal da Ordem a inclusão do nome social das mulheres advogadas trans na Carteira da OAB.
Hoje secretário estadual da Pessoa com Deficiência, Marcos foi responsável pela cessão do Museu da Inclusão para abrigar a Conferência da Mulher Advogada. E lá estava ele, para externar sua indignação com a realidade que ainda vitima muitas mulheres: “Os números da discriminação à mulher no país ainda são vergonhosos. Em mais de 70% dos lares em que nascem filhos com alguma deficiência, o pai abandona a casa, deixando a criança para cuidado exclusivo da mãe”.
A presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB SP, Isabela Castro de Castro, enfatizou que o trabalho do colegiado volta-se “a todas as mulheres, de todos os corpos, de todas as cores, de todas as orientações sexuais”, de modo a contribuir para “a construção de uma sociedade mais justa e igualitária”.
Isabela citou o rigor com que a Secional lida com aqueles que não compreendem a palavra respeito: “Pessoas desrespeitosas e violentas contra a mulher são excluídas dos quadros da Ordem”.
Também se pronunciaram na sessão de abertura da Conferência a secretária-geral adjunta da OAB SP, Dione Almeida; as conselheiras federais da OAB por São Paulo, Silvia Souza e Daniela Liborio; a vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada da Secional, Ana Carolina Lourenço; a vice-diretora da Escola Superior da Advocacia (ESA), Sarah Hakim; e a presidente do Conselho Estadual da Condição Feminina, Delegada Rose. Também compuseram a mesa solene de abertura a vice-presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Amazonas, Nancy Segadilha, primeira mulher a ocupar o cargo.
“Que o feminismo que praticamos seja aquele que não deixa ninguém para trás. Que nossas instituições sigam fortalecidas nesta caminhada”, conclamou Dione.
Para Silvia, as mulheres “fizeram sua luta acontecer e, hoje, reforçam seu papel na sociedade”. Primeira mulher a presidir a Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB, Silvia disse que a dimensão da Conferência reflete “a ação das mulheres advogadas por políticas afirmativas, como a conquista da paridade nas chapas que concorrem nas eleições da Ordem”.
“Que sejamos precursoras de novas ações, que rompam as barreiras que ainda existem. Nosso futuro certamente será melhor que o nosso passado”, afirmou Daniela. Ana ressaltou a importância da união das advogadas: “Nós queremos mulheres que transformem. Devemos seguir irmanadas, fortalecidas, para gerarmos transformação”.
Sarah, por sua vez, alertou para uma questão persistente: os retrocessos legislativos a que as mulheres estão sujeitas. “A reforma trabalhista, por exemplo, retirou com a força de lobbies econômicos avanços auferidos ao longo de décadas. O campo legislativo, muitas vezes, macula nossos direitos”, destacou a a vice-diretora da ESA.
Coube à Delegada Rose fazer mais um alerta: a violência contra a mulher e os casos de feminicídio vêm aumentando. “Se não nos unirmos, vamos retroceder. Não podemos deixar que passem por cima de direitos conquistados com muita luta”, pontou a presidente do Conselho Estadual da Condição Feminina.
A Conferência prosseguiu com painéis sobre “Mulheres no Espaço de Poder”, “Saúde em Pauta”, “Desafios Profissionais da Mulher Advogada”, “Maternidade Fora de Pauta: Útero em Discussão” e “A (Des)Proteção da Mulher no Trabalho”.