Skip to main content
ComissõesNotícias

OAB SP realiza 1º Congresso da Advocacia sobre Mercado de Carbono e Biodiversidade

By 25 de agosto de 2023No Comments

Especialistas destacaram a importância da atuação da advocacia, uma vez que o setor necessita de regulação

A Ordem dos Advogados do Brasil secional São Paulo (OAB SP), por meio de sua Comissão Permanente do Meio Ambiente (CPMA), promoveu o 1º Congresso da Advocacia sobre Mercado de Carbono e Biodiversidade. O evento, que aconteceu na quinta-feira (24), contou com a abertura da presidente da Comissão, Rosa Ramos.

“Este é um congresso mais que necessário no atual momento, e é uma alegria sediá-lo aqui na casa da advocacia”, celebrou.

A programação foi composta por três painéis. O primeiro, Expectativas para COP Clima/2023 e COP Biodiversidade/2024, foi presidido pela advogada e presidente do IDPV – Instituto O Direito por um Planeta Verde, Patrícia Iglecias. Participaram da discussão Braulio Ferreira de Souza Dias, diretor de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade no Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima; Juliana Lopes, diretora técnica de Natureza e Sociedade do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS); Glauco Kimura, gerente do Clima na Rede Brasil do Pacto Global da ONU; e Ludovino Lopes, advogado especialista em Mudanças Climáticas, Serviços Ambientais e Finanças Sustentáveis.

Braulio Dias iniciou sua fala lembrando os avanços recentes na agenda da sustentabilidade. “Na COP 15, foi aprovado o Novo Marco Global de Biodiversidade. Pela primeira vez temos objetivos de longo prazo para a conservação, o uso sustentável, a repartição de benefícios e os meios de implementação.” O diretor de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade desmembrou as 23 metas estabelecidas na conferência para o ano de 2023 e explicitou um plano de ação. “A primeira etapa para implementar o Novo Marco Global de Biodiversidade é sua internalização em cada país por meio da EPANB – Estratégia e Plano de Ação Nacional de Biodiversidade”, disse.

Já a diretora técnica de Natureza e Sociedade do CEBDS, Juliana Lopes, dedicou seu discurso a reforçar a necessidade de tratar a proteção ao clima e à biodiversidade de maneira integrada. “São duas agendas absolutamente interdependentes, dois lados de uma mesma moeda. A crise climática nada mais é que o reflexo da má gestão da natureza, então é fundamental que a gente promova essa integração”.

A presidente da mesa, Patrícia Iglecias, parabenizou o CEBDS por sua interlocução com as empresas nas pautas sustentáveis. “Gostaria de ressaltar o papel do CEBDS de trazer o setor privado para essas agendas. Essa é uma agenda que demanda maior eficiência no desenvolvimento da atividade econômica e é, portanto, totalmente aderente ao desenvolvimento do setor privado”, pontuou a advogada.

Além de Juliana, o representante do Pacto Global da ONU, Glauco Kimura, também abordou a necessidade de endereçar as pautas da biodiversidade e do clima de modo interdisciplinar. “O simples termo ‘regulação do mercado de carbono’ já remete a três coisas: advocacia, economia e meio ambiente. Estamos em um momento de trabalharmos todos juntos e eu vejo com muito otimismo esse movimento.” Ele apontou que os dados de desmatamento do primeiro semestre de 2023 demonstram queda em torno de 33%. “É uma sinalização positiva, visto que mitigar o desmatamento é uma ação importante para fazermos a nossa parte em termos de redução da emissão dos gases de efeito estufa.”

O advogado Ludovino Lopes fechou o primeiro painel ressaltando que vários aspectos jurídicos devem ser levados em consideração antes de qualquer iniciativa no âmbito ambiental. “O mundo não está preparado para criar um conceito jurídico de ativos ambientais. Estamos tentando regular o mercado nas suas estruturas através de contratos e formulações, sem formular qual é o bem sujeito à transação. Isso tem um conjunto enorme de implicações. A gente precisaria começar a construir uma matriz econômica ambiental em que o carbono seja uma atividade produtiva, a biodiversidade seja uma atividade produtiva, a água seja uma atividade produtiva, e assim por diante”, opinou o especialista.

O segundo tema da tarde abordou a Regulação Socioambiental e Econômica dos Projetos de Carbono em Florestas. A mesa foi presidida pelo conselheiro do Carbon Disclosure Project (CDP) na América Latina, Marco Antônio Fujihara, e contou com as contribuições do advogado Rodrigo Sales; da engenheira florestal e diretora executiva adjunta do Imaflora, Patrícia Cota Gomes; e da secretária dos Povos Indígenas do Estado do Acre, Francisca Arara.

“Minha grande percepção é que a gente precisa de regulação. A falta de regulação permite qualquer coisa e já faz alguns anos que a gente está atrás desse processo regulatório”, disse o presidente da mesa, que acrescentou: “Os advogados têm muito mais contribuição nesta área do que imaginam, é extremamente necessário colocar ordem nesse processo”.

Rodrigo Sales apresentou alguns pontos do Projeto de Lei que está tramitando no Legislativo e visa estruturar o mercado de carbono. “O projeto é só um início, mas tem uma clareza de conceitos e aspectos positivos que eu gostaria de destacar. Ele traz uma implementação por fases, tem primeiro o foco em regular e estruturar o monitoramento das emissões pelas possíveis entidades, que depois serão obrigadas a cumprir metas e, eventualmente, poderão usar do aspecto da comercialização. Ou seja, aqueles que cumprem suas metas e passam a ter um saldo do que foi estabelecido poderão comercializar essa diferença para aqueles que não conseguem cumprir suas metas com a mesma eficácia econômica”, explicou.

A conversa também teve a contribuição de Patrícia Cota Gomes, que falou dos mecanismos de valorização da biodiversidade. “A gente acredita que uma das melhores estratégias de conservação é a valorização da floresta em pé, de forma que a gente possa gerar benefícios sociais para quem vive da floresta e na floresta. Existe uma biodiversidade que a gente praticamente não conhece, com muito pouco investimento, mas que pode trazer respostas a questões desafiadoras da sociedade atual. Por isso, o Brasil precisa colocar a biodiversidade no eixo da decisão estratégica do país, com a regulamentação como um mecanismo facilitador para que esses negócios aconteçam em uma escala maior”, opinou a representante do Imaflora.

A secretária dos Povos Indígenas do Acre, Francisca Arara, finalizou o segundo painel refletindo sobre o olhar do povo indígena a respeito do tema regulatório. “Aqui no Acre a gente tem um cuidado para que o desenvolvimento não chegue de qualquer forma. Somos 34 terras indígenas, e 29 têm seu plano de gestão territorial e ambiental. Não é uma lei, mas é uma regra na qual olhamos como estamos usando o nosso território. As terras indígenas vão muito além de ativo, de contrato, de negócio”, concluiu.

O último painel do Congresso foi Mecanismos de Preservação da Biodiversidade, com mesa presidida pelo advogado e membro da CPMA da OAB SP, Gabriel Burjaili. Marcos Rosa, doutor em Geografia Física pela Universidade de São Paulo (USP) apresentou o projeto MapBiomas, do qual é coordenador técnico. “É uma iniciativa da sociedade civil para a produção de dados públicos, gratuitos e com base científica, que surge dentro do contexto de monitoramento das mudanças climáticas. Sempre que a gente discute regulação e projetos, a gente precisa se basear no conhecimento. Precisamos saber o que existe e onde existe para entender o que está acontecendo e continuar monitorando a situação após a aplicação dos projetos”, comentou Burjaili.

A engenheira florestal Regiane Borsato, por sua vez, apresentou o trabalho do Instituto Life, em que atua como diretora executiva. “Os créditos de biodiversidade são um assunto altamente em voga. Assim como a gente está vivendo uma série de avanços em relação ao mercado de carbono, eu não tenho a menor dúvida de que a próxima onda é a da biodiversidade. Um crédito ‘Life’ de biodiversidade reflete a eficácia de projetos e investimentos em conservação, considerando, além de outros fatores, a adicionalidade e permanência. Esses critérios têm como parâmetro fundamental a composição, a estrutura e a função dos ecossistemas. Não tem como a gente avaliar a biodiversidade sem saber se estamos falando de uma floresta vazia ou se temos remanescentes das populações ativas, por exemplo”, explicou a engenheira.

Doutor em Ciências Florestais e conselheiro sênior da Permian Brasil, Miguel Milano, fez uma fala contundente defendendo a urgência de se “dar preço à natureza”.

“Eu tenho uma pergunta para fazer a vocês: Imaginem uma máquina que consiga fazer a limpeza do ar, sugando o que está aí e devolvendo oxigênio limpo e água para a atmosfera. Quanto vale um invento desses? Essa máquina já existe, ela tem um nome e todos a conhecem. Chama árvore. E que valor se dá para a árvore? Ela pode até ter valor emocional, mas valor não é preço. Enquanto ela não tiver um preço, lamentavelmente ela não vai ficar em pé. Preço é o que define”, provocou o pesquisador.

Ao fim do terceiro painel, a presidente da CPMA, Rosa Ramos, agradeceu aos palestrantes e espectadores e finalizou o evento com um apelo: “Faço questão de sempre ressaltar a necessidade que nós temos de levar essa temática para a Academia. É importantíssimo que os jovens aprendam sobre isso. Se nós não tivermos a continuidade desses ensinamentos, eu creio que não vamos chegar a lugar nenhum”.