Durante a programação, foram realizadas palestras com temas diversos, como acordos, habeas corpus e crimes contra a ordem tributária
A OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil secional São Paulo) dedicou o quarto dia de Jornada Cultural, nesta quinta (10), à prática criminalista. O evento gratuito acontece na sede da entidade e reúne, até sexta-feira (11), Dia da Advocacia, uma programação com mais de 35 palestras e 50 palestrantes sobre diversos assuntos pertinentes ao Direito em comemoração ao Mês da Advocacia.
O uso da tecnologia a favor da prática jurídica foi a questão abordada pela primeira palestra do dia, Soluções para a Advocacia na Revolução Digital, realizada pelo vice-presidente da OAB SP, Leonardo Sica. “Com a tecnologia, a profissão não deixa de existir, ela se desdobra. A tecnologia dá ao advogado a oportunidade de ser melhor na carreira e ascender com mais velocidade”, defendeu.
O vice-presidente contou que, recentemente, a OAB SP lançou um marketplace de lawtechs que reúne mais de 60 empresas selecionadas pela secional paulista para prestar serviços de tecnologia para advogados e escritórios. Antes de finalizar sua fala, Leonardo Sica trouxe uma reflexão: “É possível que o futuro da nossa profissão pertença às pessoas mais capazes de trabalhar em parceria e colaboração entre pessoas e máquinas. Só vai evoluir quem evoluir junto com as máquinas. Os valores distintivos do profissional do Direito são a empatia, a imaginação, a subjetividade, o desafio. A inteligência artificial interpreta e aprimora, mas ela não desafia. Pessoas e máquinas podem trabalhar de maneira simbiótica. Não tem alternativa para ser bem sucedido que não usar a tecnologia.”
O segundo tema da manhã ficou a cargo de Caio Favaretto, presidente da Comissão da Advocacia Criminal da OAB SP. O advogado falou sobre os Desafios da Advocacia Criminal. “Se para uma seleta parte da população é possível preservar a democracia, para a maior parte não se pode dizer o mesmo. Atuar no direito criminal é desafiador porque nós atuamos onde esses dois mundos convergem”, declarou.
Seu discurso também mencionou mortes recentes decorrentes de ações policiais no Brasil. “Nos últimos eventos, na Bahia, no Guarujá e no Rio de Janeiro, foram mais de 50 pessoas mortas. Todas pobres, pretas ou pardas. Tenho dúvidas em dizer se avançamos muito desde a chacina da Candelária, que completou 30 anos em julho. Quanto mais cedo nos orientarmos para uma política de prevenção de danos, mais cedo pouparemos a vida de nossos jovens da periferia. Na advocacia criminal, não há soluções mágicas, elas operam em um lugar muito incômodo daquele que luta pelo Estado contra o Estado, para que se tracem com clareza os limites de sua atuação pela legalidade”, explicou.
Para encerrar a programação da manhã, a mestre em Direito Penal e Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca, Marina Gomes, explanou sobre Violência Obstétrica. A jurista explicou que a violência obstétrica é uma prática que começou a ser considerada uma questão de saúde pública, tendo em vista que a sua incidência no Brasil é de 25%. Ou seja, 1 em cada 4 mulheres são vítimas desse tipo de violência.
“Embora seja um tema que, recentemente, passou a ter mais repercussão em razão de alguns casos midiáticos, a violência obstétrica não é um fenômeno novo. Mesmo assim, nós ainda não temos uma legislação para a violência obstétrica, o que leva a uma repercussão sobre a forma com que o judiciário lida com os casos. Além de tipificar a conduta de violência obstétrica, é preciso estabelecer procedimentos para sua prevenção. Isso é essencial, considerando que a mera criminalização por si só não vai coibir a prática. É um problema multifatorial”, declarou Marina.
O período da tarde teve início com uma palestra da presidente da OAB SP, Patricia Vanzolini, sobre a Resolução 484 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que dispõe sobre o reconhecimento de pessoas. “A nossa memória tem apreensão subjetiva e atenção seletiva. Vai construindo a si mesma ao longo do tempo. O Código de Processo Penal ignora tudo isso, o que dá origem a um número imenso de erros de reconhecimento no judiciário.” A resolução 484 vem para trazer menos incerteza jurídica diante do tema. “É um ato normativo importante e o STJ tem se manifestado a favor da resolução. Por isso, temos que ser conscientes de que a resolução existe, sermos combativos e incansáveis, subindo o caso até o STJ, se necessário”, afirmou a magistrada.
Os Aspectos Práticos da Advocacia Criminal em Casos Envolvendo Crimes contra a Ordem Tributária foram tema da explanação da Bruna Nunes, membro da Comissão Especial de Advocacia Criminal da OAB SP. Ela mencionou a sobreposição das práticas do direito penal e do direito tributário e contou que é comum nos depararmos com uma representação fiscal de fins penais, uma vez que há uma enorme confusão de conceitos pelo magistrado.
“Todo mundo sabe que os crimes contra a ordem tributária são um instrumento de arrecadação do Estado. Isso gera discussão desde sempre, porque o direito penal não deve ser um instrumento de arrecadação. Fato é que, desde 1965, a lei já previa a extinção da punibilidade a partir do pagamento do crédito tributário. O fisco não quer processar, ele quer que seja pago o tributo”, concluiu.
A mestre e doutora em Direito Processual Penal, Marta Saad, ficou responsável por trazer à Jornada uma discussão sobre os Acordos Criminais. Ela informou que há um movimento internacional de adoção ao modelo de acordo nos processos penais, porque ele traz uma série de vantagens: “Isso acontece especialmente para as infrações de menor potencial ofensivo. Há uma ideia de tirar do sistema punitivo essas condutas. Não é descriminalizar, mas despenalizar. Esses modelos consensuais permitem que o acusado responda a uma acusação penal sem que seja, necessariamente, condenado ao fim, o que tira a possibilidade de estigmatizar o indivíduo com uma sentença. São mecanismos que trazem ao processo penal uma ideia de desburocratização do modelo de justiça criminal.”
O dia de programações voltadas à área criminalistas encerrou com uma apresentação do conselheiro federal da OAB, Alberto Toron, sobre Habeas Corpus e o Controle do Devido Processo Legal. Ele convidou o advogado e professor Glauter Fortunato Dias Del Nero para acompanhá-lo à mesa. “Quando pensamos em habeas corpus, é importante que tenhamos em mente que estamos falando não apenas de um instituto que interessa ao processo penal e seus operadores envolvidos no manejo do sistema da justiça do início ao fim. Falar de habeas corpus é falar de direito constitucional, mas sobretudo falar dos limites do poder punitivo estatal em relação ao cidadão. Falar sobre habeas corpus pressupõe o estado de direito e o respeito a regras que demarcam competências que limitam o poder de atuação repressiva do Estado”, discursou.
A Jornada Cultural é um evento gratuito que reúne uma série de conteúdos sobre a prática jurídica em celebração ao Mês da Advocacia. Ela conta com o apoio institucional da CAASP (Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo) e da OABPrev-SP. As vagas para participação são limitadas e as inscrições podem ser realizadas pelo site da Sympla. Todos os presentes na Jornada serão conferidos com certificados de participação e concorrerão a um par de ingressos para o Baile da Advocacia, uma noite de festa promovida pela OAB SP no próximo dia 19 de agosto em comemoração ao Mês da Advocacia.
Serviço:
Jornada Cultural
De 07 a 11 de agosto de 2023, das 9h às 18h
Endereço: Sede OAB SP – Rua Maria Paula, 35, Bela Vista, SP
Programação completa disponível em https://sites.google.com/oabsp.org.br/jornadacultural