A interrupção das atividades de inúmeras cadeias produtivas, consequência da necessidade de isolamento ou quarentena imposta pela pandemia do coronavírus, coloca em xeque a expectativa de manutenção, nos próximos meses, das vagas de emprego formal. O governo Federal começou a adotar medidas de apoio a setores da economia frontalmente atingidos, como empresas de transporte aéreo, e medidas de proteção às populações vulneráveis, como ampliação do Bolsa Família e antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS.
De forma ampla, com o objetivo de conter possíveis demissões em todos os setores produtivos, o Ministério da Economia anunciou (18/03) que pretende permitir a redução de salários, proporcionalmente à uma redução da jornada de trabalho. Na quinta-feira (19/03), complementando o anúncio do dia anterior, foi divulgada a proposta de suplementar parte da redução salarial com parcelas do seguro-desemprego, bancadas com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). As medidas precisam de debate para aprovação no Congresso Nacional, o que se daria sem alteração da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
“Como na crise de 1929, o Estado vai ter que mostrar a que veio e porque existe”, defende Jorge Pinheiro Castelo, presidente da Comissão de Direito do Trabalho. Para ele, há muito o que discutir diante do ineditismo e da proporção da crise que está posta, como o mandamento constitucional que só permite a redução de salários mediante convenção ou acordo coletivo. “Nesse ponto fica clara a necessidade de resgatar os sindicatos – que foram destruídos – e trazer as empresas para dialogar em busca de um regramento que atenda às necessidades dos dois lados”, propõe. O especialista explica que a lei indica soluções coletivas para pontos mais sensíveis, como os salários, e permite a negociação individual para outras alternativas: adoção de home office, antecipação de férias, banco de horas.
Por outro lado, os meios de proteção do trabalho dados na legislação brasileira não alcançam cidadãos cujo sustento vem do mercado informal de trabalho. “Essa crise está mostrando que foi um enorme erro não considerar como empregados os trabalhadores de aplicativos”, alerta Castelo. Ele sustenta que o enfrentamento da pandemia e os desdobramentos econômicos e sociais vão colocar em pauta o retorno do compromisso com as pessoas: “chegou o momento de um balanço, de restabelecer um compromisso social de maneira ampla – cidadãos, empresas e Estado”. Concluindo, o presidente da Comissão de Direito do Trabalho prevê que “superada a crise, o mercado não vai propor obras estruturantes de longo prazo com finalidade de bem-estar social. A falácia de Estado mínimo, que já vem sendo abandonada em alguns países desenvolvidos, será confrontada pelos resultados da crise”.