Skip to main content
CAASPNotícias

Psicóloga explica como a arte pode contribuir com a saúde mental

By 24 de agosto de 2022agosto 26th, 2022No Comments

A CAASP inicia em 5 de setembro a Campanha de Saúde Mental 2022, pela qual advogados e advogadas poderão realizar gratuitamente uma consulta psicológica (leia AQUIe seguir com o tratamento, se desejarem, por preços abaixo dos de mercado. Paralelamente, a Caixa de Assistência desenvolverá ações informativas sobre o tema da saúde mental, que seguirão mesmo após o término da campanha, em 20 de outubro.

A publicação nos veículos de comunicação da entidade de reportagens e entrevistas com especialistas é uma das frentes da ação permanente, que começa agora com uma entrevista com a psicóloga e psicoterapeuta Valéria Rodrigues. Ela traz uma boa notícia: a arte pode ser determinantemente positiva para a saúde mental.

Rodrigues, graduada em Psicologia pelo Centro Universitário Paulistano, é doutora pelo Programa de Pós-graduação em Artes (PPGartes) do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (Unesp) e especialista em Arte Terapia / Terapias Expressivas, também pela Unesp. Foi professora do curso de pós-graduação em Arteterapia / Expressões Criativas do Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa (Ijep / Facis) e do curso de pós-graduação em Arte-terapia da Unesp.

A seguir, a entrevista.

CAASP – O que leva ao surgimento e ao agravamento dos quadros de ansiedade e depressão?

Valéria Rodrigues – Existe um analfabetismo em relação à inteligência emocional, segundo Howard Gardner, psicólogo americano. A inteligência emocional diz respeito a nove áreas e estamos acostumados a pensar em inteligência apenas do ponto de vista lógico, matemático ou linguístico. Porém, existem outras áreas importantes que precisamos desenvolver, como a inteligência corporal sinestésica, espacial, naturalista, musical, existencial e as que entram no campo da psicologia, a inteligência interpessoal, que diz respeito a compreender os desafios, mudanças que criamos em relação a pensamentos íntimos, e a inteligência intrapessoal, que se baseia em como se relacionar com as pessoas.

Um ponto importante é o desequilíbrio entre o descanso do trabalho e prazer. O cérebro, que segundo a psicologia cognitiva é o órgão mais importante do nosso corpo, precisa descansar, ele não pode apenas produzir veementemente. É necessário que os profissionais, como os advogados, responsabilizem-se por dormir e ter prazer na vida além de trabalhar, estar confortável com o seu dia-a-dia. O desequilibro entre essas áreas provoca o desgaste, podendo levar ao desenvolvimento de quadros de ansiedade, depressão ou quadros mistos, que são os mais comuns nos dias de hoje.

A hiperconectividade, uma febre dos dias atuais, prejudica a saúde mental?

Sim, devemos evitar o uso excessivo das redes sociais. O problema das redes é que elas criam expectativas demais, nos afastam da nossa realidade. Criar relações a partir da realidade em que estamos inseridos é fundamental e viver se baseando no outro cria expectativas para a própria vida, gerando um desequilíbrio enorme na forma como vamos lidar com a realidade.

Além da ansiedade, algo tão comum, quais transtornos podem evoluir para um quadro de depressão grave?

As doenças mentais são manifestações de forças da natureza, segundo a psicologia junguiana, que têm como fundamento investigar as determinações profundas e inconscientes nas nossas respostas comportamentais.  Existem a depressão, a ansiedade, a compulsão, a mania, a paranoia e outros grupos mais severos, como a esquizofrenia, a psicopatia, alguns transtornos em que podemos observar o desequilíbrio das inteligências intrapessoal e interpessoal.

No individuo ansioso, depressivo ou paranoico, o que existe é a resposta ao cenário.  Precisamos identificar esses cenários ou o que incita esses atravessamentos de grandes forças da natureza que podem aparecer em qualquer lugar, em todas as pessoas ao redor do mundo desde quando a vida é vida. A diferença entre doença e saúde é a intensidade com que esses atravessamentos impactam o dia-a-dia. Precisamos identificar quais são esses cenários que estão incitando o desequilíbrio emocional e procurar ajuda profissional.

Quais suas recomendações comportamentais para que as pessoas impeçam a evolução de um sintoma normal para uma doença mental?

A psicoterapia ajuda as pessoas a se conheceram em sua intimidade. Somos singulares apenas no nosso interior em um primeiro momento, do lado de fora tendemos a responder atrelados à moral e ao espirito da época. Certos comportamentos às vezes são incompatíveis com quem somos no nosso interior, por essa razão precisamos nos conhecer na intimidade para conseguir fazer uma ‘misturinha’ entre o que a moral e o espirito da época exigem e o que somos capazes de entregar.

Além da psicoterapia, práticas como exercícios físicos, meditação, yoga (veja AQUI o rol de modalidades esportivas que a CAASP oferece) a gestão de tempo, organizar-se e priorizar o que deve ser feito antes sem se sobrecarregar são formas de preservar a saúde mental. A alimentação adequada e a correta hidratação também ajudam a aliviar o estresse, a ansiedade e a depressão.

Para quem sentir dificuldades em colocar esses conselhos em prática, há alternativas?

A primeira coisa é ficar no presente, não criar expectativas além da nossa realidade. A maior parte do sofrimento psicológico diz respeito a crenças limitantes que criamos, talhamos uma atmosfera de negatividade que nos impede de perceber as coisas boas que estão ao nosso redor.

Depois, precisamos conviver porém conviver melhor, buscar atividades em grupo, seja um grupo esportivo, ou um grupo de trabalho voluntário, atividades artísticas – a dança, o teatro, a arte de modo geral são um território muito importante para expressar aquilo que ainda não foi traduzido em palavras. “Colocar para fora”, de um modo sensível, acaba aliviando, tirando a potência de algo que nos incomoda na intimidade.

Diante dos problemas que a pandemia trouxe (hiperconectividade, abatimento, medo de perder o emprego e ficar sem trabalho), qual a sua orientação para que as pessoas consigam se tranquilizar?

Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), a saúde mental diz respeito a um bem estar que permite ao individuo ser capaz de usar suas próprias habilidades, se recuperar do estresse, ser produtivo e contribuir com a sua comunidade. Veja: é algo até certo ponto heroico na medida das inúmeras demandas do dia-a-dia. Acredito que as pessoas devem se informar mais, por exemplo, com matérias como esta que a CAASP está se propondo a fazer.

É necessário ler mais, buscar mais informações, porque qualquer um está sujeito a ter momentos em que as intensidades de certos padrões mentais se apresentam, prejudicando as habilidades e potencialidades utilizadas diariamente para trazer conforto para sua vida.

De que forma a arte, particularmente, pode ajudar?

A arte-terapia no Brasil é mais antiga até do que a própria psicologia. Temos uma grande mestra, Nise da Silveira, que na década de 50 descobriu que colocar as pessoas para trabalhar com pintura, desenho, esculturas, dança e outras expressões artísticas, com jardinagem, com atividades em que o corpo esteja envolvido, melhora o fluxo interpessoal, melhora os nossos padrões mentais.

Práticas artísticas tiram a importância de crenças negativas, limitantes, que travam ou desesperam o individuo, aliviando-os. O efeitos positivos da arte reverberam de modo bom e criativo em todas as outras áreas da vida. De modo geral, a arte-terapia libera ações criativas, então aquilo que está ocorrendo de modo sensível terá um impacto e um efeito em decisões familiares, profissionais, relacionais e existenciais, porque coloca a energia para circular criativamente e não mais defensivamente.

Desde o Iluminismo, estamos acostumados a entender como inteligência apenas as áreas lógicas, matemáticas e linguísticas, porém a inteligência sensível que desenvolvemos através da arte e em todas as suas linguagens são formas de produzirmos conhecimento e também de acessar a realidade enquanto desenvolvermos a nossa criatividade.  Isso acaba tendo impacto em outras áreas da vida.  Ser criativo é um desafio do nosso tempo, um tempo de muita escassez do qual precisamos buscar saídas, caminhos e soluções para enfrentar essa negatividade e crenças limitantes que tomaram conta das pessoas, gerando estresse, medos e transtornos.