Skip to main content
ComissõesNotícias

OAB SP se manifesta contra extinção da Comissão de Mortos e Desaparecidos do governo federal

By 12 de dezembro de 2022No Comments
Foto: Reprodução

A Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB SP), por meio de sua Comissão Permanente de Direitos Humanos e seu Núcleo da Memória, vem a público posicionar-se contrariamente à extinção da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos pelo atual governo federal, como noticiado pela imprensa.

Ao encaminhar comunicado com a convocação para a reunião no próximo dia 14 de dezembro, Arthur de Souza Casemiro da Silva, coordenador-geral de Desaparecidos, afirma que a conclusão da análise de todos os processos de solicitação de indenizações já teria ocorrido, justificando a desnecessidade da atuação da Comissão.

Entretanto, entende a OAB SP que referida justificativa não procede.

A missão da referida Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos vai muito além de seus limites técnico-burocráticos; ao contrário, comporta em sua essência a construção de vias civilizacionais transformadoras de qualquer sociedade que se queira pacificada e efetivamente restaurada em sua identidade democrática.

Vale dizer, não basta o esgotamento de objetivos administrativos, mas a efetivação dos direitos humanos sob sua mais profunda e ampla definição, com a consequente construção de um futuro de paz para as atuais e futuras gerações.

De fato, centenas de familiares ainda buscam informações sobre o destino de seus entes queridos, durante o regime ditatorial militar de 1964.

Para além da imprescritibilidade dos crimes lesa-humanidade cometidos por agentes da ditadura militar, deve-se ainda recordar que familiares são também vítimas do regime de exceção implantado no Brasil por meio golpe de Estado, dada a característica transgeracional de referidos crimes.

O esclarecimento sobre o paradeiro final das vítimas do regime ditatorial promove o alívio do sofrimento decorrente das incertezas impostas aos familiares, conforme decidiu a Comissão Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund e outros v. Brasil (parágrafo 240).

Outrossim, a revelação, pela CNV/2014, de que em torno de 8.350 indígenas foram assassinados pela ditadura, projeção apenas inicial de um trabalho que deve prosseguir a partir de novas investigações, demonstra outro exemplo que sustenta a necessidade de manutenção e a retomada dos trabalhos da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, que deve ser aperfeiçoada, não extinta, uma vez que há milhares de vítimas ainda desaparecidas, inclusive do campo e dentre nossos povos originários.

As normas internacionais, aplicadas por reiteradas decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos impõem ao Estado brasileiro a investigação sobre o destino dos mortos e desaparecidos, bem como a punição dos perpetradores. O Brasil expressamente reconhece tal jurisdição, à qual aderiu e ratificou.

Uma democracia estável e consolidada somente é possível a partir do enfrentamento do passado, compreensão de seus significados e da pacificação social.

Como ensinou Tzvetan Todorov, não é a memória, isto é, a lembrança do passado, que deve ser sagrada, mas os valores que dela poderíamos tirar.

A OAB SP, portanto, dando cumprimento à missão institucional de sempre buscar a proteção do regime democrático, acompanhará o caso e adotará as medidas necessárias, dentro de suas atribuições, para que a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos prossiga realizando sua missão.

 

Patricia Vanzolini

Presidente da OAB SP

Leonardo Sica

Vice-presidente da OAB SP

Priscila Akemi Beltrame

Vice-Presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da OAB SP

Flávio de Leão Bastos Pereira

Coordenador do Núcleo da Memória da CDH-OAB SP