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Nota técnica da Comissão de Direito do Terceiro Setor à Medida Provisória nº 1.045/2021

By 28 de julho de 2021No Comments
obrigatoriedade da participação da Advocacia na solução consensual de conflitos

A Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP, diante de propostas que podem acarretar o enfraquecimento da política pública de aprendizagem profissional e cercear o livre exercício de atividades das organizações da sociedade civil – OSCs, manifesta-se nos seguintes termos:

Há necessidade de debates mais profundos sobre os temas não mencionados originalmente na Medida Provisória nº 1045/2021, que foram incluídos no parecer apresentado pelo relator da matéria – Deputado Christino Áureo (PP-RJ), em 15/07/2021, mesma data em que se pretendia a votação em sessão extraordinária pela Câmara dos Deputados.

Compreende-se de muita importância iniciativas como o REQUIP (Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva) e PRIORE (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego), programas que visam garantir a qualificação profissional e produtiva no mercado de trabalho, oferecendo proteção social e segurança alimentar pertencente à família de baixa renda, promovendo a redução da taxa de desocupação entre o público-alvo do programa), mas que ao serem aprovadas, colocam em risco os direitos das pessoas com deficiência e até mesmo dos adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade e risco.

De maneira resumida, com a aprovação dos programas REQUIP e PRIORE supramencionados, serão criadas formas de contrato de trabalho  com redução do percentual de recolhimento do FGTS para as pessoas com deficiência e adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade ou risco, conforme o Art. 30, incisos I, II e III, que define percentuais de 2, 4 e 6% para o FGTS, dependendo do porte da empresa (pequena, média ou grande).

“Art. 30. No contrato celebrado por meio do Priore, a alíquota mensal relativa aos depósitos para o FGTS, de que trata o art. 15 da Lei nº 8.036, de 1990, será de:I – 2% (dois por cento) para a microempresa, de que trata o inciso I do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006;

II – 4% (quatro por cento) para a empresa de pequeno porte, de que trata o inciso II do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 2006; e

III – 6% para as demais empresas.” 

Haverá impacto no instituto da aprendizagem profissional, uma vez que o jovem incluído no REQUIP, de acordo com a nova proposta, no seu artigo 66, poderá vir a ser contabilizado para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem prevista no Art. 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou seja haverá um esvaziamento da política pública já eficiente no país, transferindo para um novo programa não havendo a criação real de novas vagas e sim migração das existentes:

1.- Segundo informações do Ministério da Economia, mais que 50% dos aprendizes atualmente contratados são considerados “em situação de vulnerabilidade e risco social”. Esses aprendizes serão fatalmente substituídos por jovens oriundos do REQUIP, cuja proposta se apresenta como mais vantajosa à empresa contratante, eliminando assim o impacto positivo sobre a empregabilidade e aumento de empregos no país que vem sendo executada pelo programa da Lei da Aprendizagem nº10.097/2000.

2.- Verifica-se que há conflito entre políticas para inclusão de jovens uma vez que a proposta da MPV 1045/2021 prejudicará a Lei nº10.097/2000, desta forma recomendamos que a MPV 1045/2021 seja direcionada de forma mais adequada para as pequenas e microempresas evitando conflito com a política de aprendizagem que é direcionada as grandes empresas que já atuam com essa política.

Nesta toada a proposta apresentada impacta a Lei nº10.097/2000 frontalmente:

Nova proposta da Medida Provisória 1.045/2021, 66:

Art. 66. O jovem em situação de vulnerabilidade ou risco social incluído no Requip poderá ser contabilizado para efeito de cumprimento da cota obrigatória de aprendizagem, nos termos da Lei nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000.

Parágrafo único. Para efeito do disposto no caput deste artigo, são considerados jovens em situação de vulnerabilidade ou risco social:

I – adolescentes egressos do sistema socioeducativo ou em cumprimento de medidas socioeducativas;

II – jovens em cumprimento de pena no sistema prisional;

III – jovens e adolescentes cujas famílias sejam beneficiárias de programas federais de transferência de renda;

IV – jovens e adolescentes em situação de acolhimento institucional;

V – jovens e adolescentes egressos do trabalho infantil; e

VI – jovens e adolescentes com deficiência.

Ora, não haverá eficiência em substituir uma proposta nova sob uma política já existente em pleno funcionamento e comprovadamente eficaz.

Ademais o Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória em questão ignora o papel fundamental das organizações da sociedade civil (entidades sem fins lucrativos) que historicamente possuem experiência no atendimento, assessoramento, defesa e garantia de direitos da pessoa com deficiência e, também, de adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade ou risco, na formação técnico-profissional.

O fato de hoje existirem mais de 50% de adolescentes e jovens vulneráveis e em risco social no programa nacional de aprendizagem é resultado exclusivo da participação ativa das entidades sem fins lucrativos, introduzidas no segmento de aprendizagem a partir da Lei nº 10.097/2000.

Art. 60. Consideram-se entidades qualificadas em formação técnico-profissional, aptas a oferecer a qualificação teórica e prática prevista nesta Lei:

[…]

V – subsidiariamente, as entidades sem fins lucrativos que tenham por objetivos a assistência ao adolescente e ao jovem e a educação profissional, nos termos de ato do Ministério da Economia.

 Não é possível conceber que se busque atribuir essa tal subsidiariedade à atuação organizações da sociedade civil, como entidades sem fins lucrativos, preterindo-as até mesmo diante de instituições privadas com fins lucrativos, como se observa no texto da proposta. Impressiona tal pretensão, já verificada em outras iniciativas, e espera que seja veementemente rechaçada pelos Parlamentares, exatamente por se tratar daquelas organizações que possuem expertise para atuação com o público-alvo dos referidos programas e, ainda, não têm medido esforços para minimizar os impactos da pandemia de Covid-19 na vida da população, mediante o desenvolvimento de ações socioassistenciais, educativas e de segurança alimentar, na perspectiva da dignidade humana.

Grande parte dos temas que compunham a Medida Provisórias nº 905/2019, revogada, e outras, foram reapresentados na proposta. É necessário excluir desse debate assuntos relacionados a alterações da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que já foram discutidas e não aprovadas anteriormente.

Além dessas questões, várias alterações propostas tratam de assuntos quem nada tem a ver com o Programa Emergencial do Emprego e da Renda, como por exemplo a alteração da Lei nº 5.010/1966, que trata sobre a organização da Justiça Federal, bem como da Lei nº 10.259/2001, que dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Se não bastasse, propõe ainda alteração no Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015.

Nós, da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP, na busca da efetiva garantia da participação social, esperamos dos parlamentares a oportunidade de discutir amplamente essas matérias relatadas e as demais propostas, constantes do Parecer de Plenário e da proposta  de Projeto de Lei de Conversão da Medida Provisória n.º 1.045/2021 que impacta legislação segmentada no Brasil há mais de 20 anos de inclusão social de milhares de adolescentes e jovens no país desenvolvido por organizações da sociedade civil – OSCs.

 

Ana Carolina Barros Pinheiro Carrenho

Comissão Especial de Direito do Terceiro Setor da OAB SP

 

Diego Euflauzino Goularte

Comissão Especial de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB SP

 

Lucia Benito de Moraes Mesti

Comissão Especial de Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB SP