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Dias de Ativismo: protagonismo feminino é necessário para mitigar efeitos das mudanças climáticas

By 29 de novembro de 2021No Comments
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A reportagem a seguir faz parte da campanha “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres”, mobilização global concebida pela ONU Mulheres, a qual a CAASP adere com o fim de trazer novos olhares sobre a violência contra as mulheres e reflexão para a busca de soluções. Confira outros materiais da campanha em nossas redes sociais. 

As mudanças climáticas ameaçam a proteção, a segurança, a saúde e o bem-estar de homens e mulheres. No entanto, seus impactos não são sentidos da mesma forma por todos. Se em circunstâncias normais as mulheres já são frequentemente deixadas para trás no acesso a serviços e oportunidades, com a degradação ambiental essa realidade se acentua. Assim concluiu o relatório “Violência de gênero e ligações ambientais – a violência da desigualdade” (tradução livre) da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), publicado em 2020.

O estudo é considerado um dos mais abrangentes feitos até hoje sobre as imbricações entre gênero e clima – levou dois anos e envolveu mais de mil fontes de pesquisa -, e mostra que, à medida que o planeta esquenta, os recursos naturais ficam mais escassos, secas, tempestades e inundações ficam mais intensos e frequentes. E as mulheres ficam mais vulneráveis à exploração. O relatório cita, por exemplo, como a escassez de alimentos em partes do leste e norte da África tem feito pescadores se recusarem a vender peixe para mulheres se elas não fizerem sexo com eles.

Engana-se quem pensa que essa é uma realidade distante. Recentemente, uma série de reportagens da Gênero e Número (www.generonumero.media), plataforma de jornalismo que aborda questões de gênero a partir de dados, tem mostrado as consequências da variação do clima na vida das mulheres que vivem no semiárido brasileiro, região que passa por um intenso processo de desertificação, que tem contribuído para sobrecarga feminina, alteração do fluxo migratório e dificuldades de subsistência pela agricultura e o artesanato.

Apesar de serem as mais afetadas, as mulheres têm tido uma participação insignificante na tomada de decisões para mitigar os efeitos da crise do clima, não porque estejam alienadas, mas por falta de oportunidade.

Foi precisamente esse cenário de pouca representatividade que levou a jovem Amanda Costa a seu ativismo pelo clima. Em 2017, ela recebeu uma bolsa da organização internacional World YMCA para representar a juventude brasileira na COP 23, a conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre o clima, que aconteceria em Bohn, na Alemanha. Estudante de relações internacionais na época, ela conta que não se viu representada no evento.

“O que eu vi foram homens brancos, héteros, cisgêneros, ricos e velhos falando a partir do meu lugar de fala, ou seja, falando como a crise climática iria impactar os povos vulneráveis, iria impactar a população preta, a população das periferias. E aí eu comecei a pensar: por que será que eles não me dão o microfone? Porque eu tinha conhecimento tanto empírico, quanto teórico, do impacto daquilo”, lembra Costa.

Decidida a hackear essa estrutura de baixo para cima, ela criou o Perifa Sustentável, iniciativa que enegrece o discurso climático e o aproxima das periferias, em especial as de São Paulo, onde a jovem vive – ela é moradora do Jardim Almanara, bairro da Zona Norte paulistana.

“Ao me levantar e articular a minha comunidade em torno desse tema, construímos de fato um futuro sustentável na quebrada”, afirma Costa. Ela também participa do Global Shapers, rede de jovens do Fórum Econômico Mundial que apresentam potencial para transformar suas realidades. Costa também já esteve à frente frente do Climathon Brasil, uma maratona nacional com foco no desenvolvimento de soluções que diminuam os efeitos das mudanças do clima no planeta, e do Grupo de Trabalho sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Engajamundo, uma organização não-governamental.

A jovem defende o reconhecimento de uma dimensão de gênero, racial e social nas questões do clima, a fim de evitar o chamado racismo ambiental, conceito cunhado por Benjamin Chavis pelo qual os piores efeitos da degradação ambiental acabam recaindo sobre grupos marginalizados. É preciso analisar a crise climática e a crise socioambiental a partir de uma perspectiva interseccional e transversal. Precisamos de mais gente preta dissertando sobre esse conteúdo, mais gente preta propondo ações, atividades e projetos para as comunidades brasileiras”, sublinha.

Para Amanda Costa, a ação climática não será bem-sucedida se não envolver mulheres e, no caso do Brasil, também a população negra, maioria pobre da população. “Se eu tivesse o poder de transformar algo na nossa sociedade, colocaria uma mulher preta, da periferia, no cargo mais alto de tomada de decisões para termos mudanças de verdade”, diz Costa, ressoando nas entrelinhas as palavras da filósofa Ângela Davis de que quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”.